Quando você é vulgar: apenas negocia convenções, não domina os segredos, qualquer um pode dizer que árvore é o nome de uma cidade, que cidade é o nome de uma arma, que arma é um sentimento, que sentimento é o nome de um faraó. A língua epistolar é a conversa vulgar no desentendimento, mesmo que este ocasione encontros repentinos e imprevistos. É quando uma criança autista diz pra você: se o mundo gira, porque você não fica tonto?
8/28/2011
O Livro segundo o poeta
Quando o homem criou a palavra, ela se desprendeu de seu criador. Jamais o homem reencontrou a si mesmo; sempre encontrou em si uma dobra indiscernível entre as palavras. Por isso, o homem criou seu maior erro: deus. Deus era, então, o criador da palavra, que teria tirado o homem de sua essência. Mas, ao mesmo tempo, o homem depositou em deus a confiança em que ele iria juntar novamente criatura (palavra) e criador (homem). Assim, deus teria a tarefa mais difícil de todas: a de escrever o Livro. Nele, estariam todas as palavras que foram faladas, e que serão repetidas para todo o sempre. Mais uma vez, o homem escreveu em palavras aquilo que deus, em sua tarefa infinita, deveria fazer. Ecce libro. O mundo jamais foi o mesmo. Todas as palavras estavam, enfim, ditas. Com Ele – o Livro – o homem teve novamente a fé. O homem acreditou que, agora que tinha o Livro, que a palavra estava sob seu poder. Mas, a palavra, filha de Prometeu, sempre soube fugir de seu criador, para muito além do Livro. O homem teria, por sua vez, perdido a fé. Mas a fé não está em deus, que nunca conseguirá juntar o que o homem, felizmente, separou. A fé está em cada um, que, no momento em que se põe em palavras no espelho, sempre encontrará outro. A fé existe, apesar do Livro, apesar de deus. A fé está na redescoberta diária da dobra indiscernível da grande criação do homem: a palavra. E, pela palavra, acredito todos os dias em seu poder, em sua glória, em sua beleza. Um dia, a palavra sobreviverá a todos nós. Desta maneira, dedico-me a ela como um monge, como se minha vida fosse uma oração. Gostaria de ser poeta. Mas somente a palavra o dirá, se o quiser. Assim seja.
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4 comentários:
gostei. Muito bom!
Valeu, Daniel! Abraço!
Gostei muito tbm.
Abraço!
Valeu, Aldemar. Grande abraço para você e seu poema está muito bom também!
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