Alguma coisa que não se resolve, e nem
é mistério, num monolito em suspenso
o rótulo todo rabiscado onde
está inscrito 'alma' entre outras besteiras (espia,
tudo aqui é fissura), essa conjunção
de partículas de treva parece ser
sua - aí, ele disse,
a crise atinge a página
do tempo, agora mesmo, e num instante você
se sente ligado ao presente mas
é só um efeito das palavras, na seqüência
de rajadas, e empena
acima o olho estoura
diante da luz
simulada.
(das "Notas Marginais")
imagem: acrílico sobre tela de Eduardo Iglesias.
4 comentários:
Oi Aldemar,
to acabando de ler um livro que tem muito a ver com esse teu poema aí, a História do Diabo, do Vilém Flusser. Ele fala umas coisas sobre poesia, no capítulo Soberba, das palavras como teias da vontade. Mas parece que você está se encaminhando pra última etapa do Inferno: a preguiça. Também estou chegando lá.
Acho que você vai gostar muito deste livro. é incrível.
Abraço,
Daniel.
Daniel,
já li algumas (poucas)coisas do Flusser e achei muito interessante.
Não sei que abordagem a dele neste livro, mas parece mesmo interessante e afim com o que tenho lido, que envolve a materialidade da palavra, e sua indiscernibilidade do corpo e do pensamento.
Você podia me falar mais sobre esta última etapa do Inferno?
Ela limita com o que?
abraço, Daniel.
Ainda não terminei de ler, mas ela parece ser mais o limite final do Inferno. Preguiça no sentido de "tristeza do coração".
é mais ou menos o seguinte:
O diabo é devir, o mundo - é aquela história de que quem criou o mundo foi o diabo, e não Deus. Resumindo grosseiramente, os pecados são níveis ontológicos: luxúria é a vida; ira é o desejo de conhecimento; gula é o trabalho; inveja e avareza são a sociedade; soberba são as artes e preguiça é a dissolução final, a percepção de que o diabo não é um ser por trás da aparência, de que não há mais ontologia. Mas como ainda assim amamos o mundo e a vida, não vamos pro lado de sua negação ou ultrapassagem. Os outros pecados continuam "ativos" no inferno dos preguiçosos.
Mas o mais importante é: como o livro é bonito! é um ensaio ficcional poético.
Abraço,
Daniel.
Puxa, e são coisas táteis estas idéias, coisas que a gente pensa, de outra forma talvez, na hora em que se faz um poema, ou no caminho até chegar o poema (no sentido que ele propõe a preguiça parece estar clara, acho, nisso que escrevi).
Vou procurar pra ler, pode ser que abra um caminho, uma visada.
grande abraço
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