10/20/2007

nº 53




Atravessar o deserto de carne, tantos
relevos de pele, numa aventura
da cor e do som, do gesto (tudo
é deserto
, ele disse), na terra trêmula,
e a salvação vem daí, é parte
dele ou erra exilada pelas paredes
ácidas de uma dúvida
que não cauteriza e nem
percebe ao certo. É sua alma o que vaza quase
todo dia em jatos e estertores, na hora
em que pesa mais, um pouco mais
que o corpo possa suportar. Salvação,
abrigo, redenção,
caminho, o que for,
veio tarde: seus pés
afundam no chão duro
e é aí que você vai ficar, convulsivo,
quando a miragem passar.
(das Notas Marginais)

4 comentários:

Unknown disse...

Gostei do movimento, Aldemar. Da tensão entre deserto de carne e miragem. Mas o verso final não é conclusivo, a conclusão, estou certo? Se há alguém, a miragem vai reencarnar no deserto de carne. To pensando no poema, porque pra mim morte é ponto final e ponto.

Aldemar Norek disse...

eu não tenho mesmo conclusão, nem sobre o poema, nem sobre o que o moveu para fora.
mas explica melhor o que você quis dizer,ok?
queria entender.
abração

Unknown disse...

Oi Aldemar,

é que eu entendi que o seu poema faz um movimento da carne à miragem, e também termina numa imagem de desespero.
Não que eu ache que literatura deva ensinar qualquer coisa, muito menos otimismo: mas tenho pensado um pouco sobre a amargura como uma atitude meio antipoética.
Se a miragem for tratada como uma reaproximação da carne, um reencarnar neste sentido,o poema faz um movimento de retorno ao começo.

Não sei se fui claro. Cada vez minhas ressacas estão piores. A idade e a perda de hábito, ando bebendo pouco. E pra piorar, ontem a noite acabou numa discussão idiota sobre Kasparov e o Deep Blue 2. Acordei meio confuso...

Abraço,


Daniel.

Aldemar Norek disse...

Não sei, acho que é um mundo louco, muito louco, e a amargura é parte disso. Se isso é antipoético pode ser que viver tbm seja.

Também queria acreditar numa função pedagógica do poema(não que tenha a idiotice de acreditar que qqer coisa que eu escreva pudesse ter esta função).

Queria mesmo que a miragem reaproximasse da carne, reencarnasse. Acho que tem perdas definitivas, no deserto em torno. E aproximações difícieis. Difíceis.

Postei outro poema aí que este seu papo influiu.

abração, como sempre.