Quando você é vulgar: apenas negocia convenções, não domina os segredos, qualquer um pode dizer que árvore é o nome de uma cidade, que cidade é o nome de uma arma, que arma é um sentimento, que sentimento é o nome de um faraó. A língua epistolar é a conversa vulgar no desentendimento, mesmo que este ocasione encontros repentinos e imprevistos. É quando uma criança autista diz pra você: se o mundo gira, porque você não fica tonto?
Pois é Aldemar, acho que é esse mesmo o espírito da coisa. Sobre aquele papo de produção de sentido,lendo estas coisas de 50, 60 anos atrás, a sensação que eu tenho é de que o mundo é total contingência, não tem estrutura nenhuma sustentando nada. Nem mesmo a História com H maiúsculo.
Com o tempo, as pessoas vão fazendo uma seleção do que vale e não vale como sentido aceitável, por isso o passado começa a soar familiar, como todo o resto por sinal. Se lemos um Freud da vida, o que ele diz faz algum sentido pra gente. Mas quando saímos do óbvio, o chão some e a gente descobre que a loucura pra gente era bom senso na época e vice-versa. Conversar com o passado é que nem conversar com um louco que parece "normal" o tempo todo, a não ser quando revela seus planos mirabolantes, que nem o Schreber, juiz sensato, mas ao mesmo tempo a puta predileta de Deus.
Tudo é contingência, mesmo. é cada um passar o seu (dele) recado e sumir do mapa. E aguardar pela resposta de alguém, que ela chega de um jeito ou de outro. E não se entregar à morte e não aceitar o jogo de quem preferia que a gente se calasse, como o Rubem Cretino por exemplo.
Daniel, conversar com o passado às vezes é como conversar com um louco que muda de cara a cada instante - pq o passado pode ter muitas interpretações, todas simultâneas e incoerentes entre si (e é duro ir de encontro aos sentidos não-aceitáveis, não é?)...
Sobre o seu poema aí debaixo me lembrei de uma coisa engraçada: Shekespeare vivia uma espécie de vida "dúpla": em Londres ele era o poeta, ator e dramaturgo; em Stratford-upon-Avon ele continuava os negócios de seu pai,com sucesso (produzia trigo, fabricava alguma coisa, enfim- era um homem de negócios). Quando ele morreu a cidade ergueu uma estátua onde ele segurava um saco de trigo - uma homenagem ao "homem de negócios". Com o passar do tempo, décadas depois, substituiram o saco de trigo por uma pena com um papel embaixo - o dramaturgo tinha se sobreposto ao homem de negócios.
Acabo de perceber que isso reforça o primeiro parágrafo: as mil faces do passado, o viés da interpretação e a fuga (permanente) do sentido.
Mas o que eu queria comentar a partir disto era outra coisa,mais prosaica e banal (que agora perdeu o sentido...).
2 comentários:
Pois é Aldemar, acho que é esse mesmo o espírito da coisa. Sobre aquele papo de produção de sentido,lendo estas coisas de 50, 60 anos atrás, a sensação que eu tenho é de que o mundo é total contingência, não tem estrutura nenhuma sustentando nada. Nem mesmo a História com H maiúsculo.
Com o tempo, as pessoas vão fazendo uma seleção do que vale e não vale como sentido aceitável, por isso o passado começa a soar familiar, como todo o resto por sinal. Se lemos um Freud da vida, o que ele diz faz algum sentido pra gente. Mas quando saímos do óbvio, o chão some e a gente descobre que a loucura pra gente era bom senso na época e vice-versa. Conversar com o passado é que nem conversar com um louco que parece "normal" o tempo todo, a não ser quando revela seus planos mirabolantes, que nem o Schreber, juiz sensato, mas ao mesmo tempo a puta predileta de Deus.
Tudo é contingência, mesmo. é cada um passar o seu (dele) recado e sumir do mapa. E aguardar pela resposta de alguém, que ela chega de um jeito ou de outro. E não se entregar à morte e não aceitar o jogo de quem preferia que a gente se calasse, como o Rubem Cretino por exemplo.
Abraço,
Daniel.
Daniel,
conversar com o passado às vezes é como conversar com um louco que muda de cara a cada instante - pq o passado pode ter muitas interpretações, todas simultâneas e incoerentes entre si (e é duro ir de encontro aos sentidos não-aceitáveis, não é?)...
Sobre o seu poema aí debaixo me lembrei de uma coisa engraçada: Shekespeare vivia uma espécie de vida "dúpla": em Londres ele era o poeta, ator e dramaturgo; em Stratford-upon-Avon ele continuava os negócios de seu pai,com sucesso (produzia trigo, fabricava alguma coisa, enfim- era um homem de negócios). Quando ele morreu a cidade ergueu uma estátua onde ele segurava um saco de trigo - uma homenagem ao "homem de negócios". Com o passar do tempo, décadas depois, substituiram o saco de trigo por uma pena com um papel embaixo - o dramaturgo tinha se sobreposto ao homem de negócios.
Acabo de perceber que isso reforça o primeiro parágrafo: as mil faces do passado, o viés da interpretação e a fuga (permanente) do sentido.
Mas o que eu queria comentar a partir disto era outra coisa,mais prosaica e banal (que agora perdeu o sentido...).
abração...
Postar um comentário