12/30/2006

oração desbarrocada de huuns e outros, pello fim do amno da graça de 2.006 e suas desvairadas razõoes



tacho do mundo onde se amassa a gororoba do Destino
cacimba grande cheia de um lodo pelos séculos decantado
página arabescada em que se aninha o gozo que farfalha
(ó favos onde a alma se lambuza)
ou poço escuro que me turva a dura via e que transmuta
o horizonte em muro
livrai-nos, ó caldeirão fervente, do massacre da objetividade
e sua ruma milionária de erros
livrai-nos da mediocridade
do que não é humano e nos consome
da escrotidão humana e das leis onde ela cabe

e fabricai um deus no espaço entre as moléculas, na fissura dos dias
nas brechas entre seus grãos, fabricai um deus, um orixá
no espaço entre as chamas, no espaço em chamas
movido pela vertigem das balas traçantes
um orixá que cante um ponto novo e que derreta
a cera dos ouvidos
e nos ampare nesta mata agora
sem saída

12 comentários:

Daniel F disse...

Te acompanho na prece, Aldemar.

Anderson Dantas disse...

quando acamparemos nas cidades esplêndidas? espero ver Rimbaud numa missa alegre, e que sirva-se absinto para todos ...

Aldemar Norek disse...

o problema é que a cidade só serve à lógica do capital - e não á lógica do encontro, da troca verdadeira. Enquanto isso só são possíveis missas negras - e o absinto é tomado pelos cantos, pelas brechas, pelas frestas.
Não existem cidades esplêndidas para o Nômade.

Eliana Pougy disse...

Portanto, para que desejaríamos cidades?

Aldemar Norek disse...

A cidade é uma aspiração legítima, uma decorrência de ser Humano e desejar o encontro. Mas os mecanismos do capital são de tal ordem, de tal especialização, que de fato transformam tudo em mercadoria - e a própria elaboração do espaço urbano é ferramenta neste processo. Basta ver que o "espaço público" cada vez mais cede lugar àquele "pseudo-público" do shopping-center -e este se torna "a presença" no imaginário dos cidadãos, "o Lugar" onde estes (nós) desejam passar suas horas de lazer. O restante dos espaços públicos, os realmente públicos, estão sendo gradeados e dominados pelo medo e pelo controle big-brother. Pelo jeito só a Poesia salva.

Aldemar Norek disse...

E tem uma outra coisa. Não sei a que ponto o "espaço virtual" está influenciando o "espaço real" das cidades. Você está em sampa, Daniel em Santos, o Anderson em Floripa, a Masé e o Löis no Rio (e eu sequer os conheço pessoalmente, mesmo sendo "concidadãos!!!). É isso - rola uma transferência do real para o virtual - a "ágora" grega perde lugar ou se transfere para o imaterial. Isso tem um lado bonito, podemos "estar" juntos agora e aqui. Mas por outra nos afasta de certas realidades ou as transforma em algo "apenas da tela", como esta ignomínia do assassinato do assassino Saddam. Pudemos "ver" até os momentos "íntimos" que precederam o crime (e desconfio que deve haver o crime em si aí rolando pela net). Assim como foi possível ver e se horrorizar (por segundos) com o que aconteceu em Abu Graib. No entanto a classe média não se horroriza com a violência de cima pra baixo que rola do lado dela aqui no Rio, ou em Sampa, da qual os horrores de anteontem são apenas um sintoma.

Eliana Pougy disse...

Vou citar Deleuze: "erramos quando acreditamos nos fatos: só há signos. Erramos quando acreditamos na verdade: só há interpretações. O signo tem um sentido sempre equívoco, implícito e implicado". Beijo grande.

Daniel F disse...

e eu moro em duas cidades: Brasília e Campinas, duas iguais em muita coisa. Jamais quero morar no sertão. mas acho que a web não difere muito - pode até piorar algumas coisas, uma vez que o parâmetro da astúcia pode se reduzir a pseudônimos, não são necessários outros acessórios urbanos. Acho que o Aldemar tem razão nesse aspecto de Nomadismo, mas também gosto de ilhas, como esta ilha-epistolar. E também quero tomar um porre de absinto. Abraços

Aldemar Norek disse...

acho mesmo este panorama medieval. Temos estas "ilhas", como esta nossa ilha epistolar, uma parte do Cronópios e outras comunidades (o mesmo nome que se dá a "favela" aqui no Rio...Comunidade é coisa de excluídos, portanto?).
Acho que Deleuze neste sentido (se é que entendi, Eli, pq mitas vezes qdo vc cita o cujo me vejo perdido e não encontro o que vc está querendo dizer....) acho que o Deleuze aqui, esta forma de pensar assim recortada pode funcionar como elemento de alienação - e não de abordagem da vida, de tentar alguma modificação, que no fundo é o que é importante pra mim, mesmo que só se possa fazer isso a nível micro, imediato, muito próximo, como aqui.
bjs

(ah, e troquei Campinas por Santos, sorry...rs, coisas de ser meio mr. magoo)

Haemocytometer Metzengerstein disse...

Uma coisa estranha que eu noto - mesmo com a proximidade que a vida online nos oferece, ainda é impossível o principal, o mais perigoso do contato entre as pessoas: o olho-no-olho.

Por isso não consigo usar webcam em chat – me aflige isso de ver a pessoa na tela olhando para a tela, e não para a câmera, para mim, como eu sei que ela também deve estar me vendo.

É essa a cisão de que Foucault falava, o duplo empírico-transcendental que caracteriza o Homem como objeto-sujeito das ciências humanas, reduzida ao absurdo pela representação digital: não podemos ser objetos e sujeitos ao mesmo tempo, não somos vistos nunca onde estamos vendo.

Eliana Pougy disse...

Cito o Deleuze pra você ficar perdido, mesmo, Norek. Hehe. Uma interpretação, com a que você fez, sempre incorre no "de onde você fala", ou ainda, "qual é o desejo que afeta o lugar de onde você fala". Dessa forma, o desejo não é de um sujeito, mas de uma situação em que o atravessa. O que você interpretou como cidade não se baseia em fatos, mas em signos. E o sentido desses signos é sempre implicado naquilo que te atravessa. Por isso, não concordo que a Cidade é uma aspiração legítima. O encontro, sim. Beijo.

Aldemar Norek disse...

ah, como as mulheres são cruéis....rss.
mas acho que a cidade é a resposta humana ao encontro que se deseja.
ainda não se arrumou outra coisa.
fiz o comentário a partir da constatação de que, em termos bem reais e práticos, a cidade é o que há, em termos majoritários de resposta à necessidade de encontro. A leitura deleuzeana poderia se dar tvz a partir do material bem real que esta visão proporciona. Como os corpos incendiados, o medo da classe média de sair às ruas, as balas perdidas, etc.
beijo