3/28/2012

A fina flor
Da brutalidade, todos os justos
Ventríloquos da lei
Têm sede de sangue
E usam lâminas
Como espelho.

Não sei porque a imagem do Bem
É a de uma roda dentada
Afiadíssima, girando em alta velocidade
No pesadelo do demiurgo:

Somos filhos de uma viagem
Errada do criador.

3/22/2012

O tempo todo

O tempo todo é único e desdobrado
Apocalipse. As divisões das eras indicam diferentes ritmos
Apocalípticos. Há inúmeros apocalipses ao redor de cada
Universo. E inúmeros universos ao redor de cada apocalipse.
Um período, qualquer, é margeado por apocalipses, assim como uma
Vida. Cada passagem, desvio é um istmo de um possível
Minuto à beira do apocalipse.

Violência organizada dentro de outras
Desorganizadas. Ou organizadas
Segundo outras ordens – inapreensíveis.

Não sei se tenho sono ou se o vento forte bate em meus
Olhos. Não sei se é assustador ou repousante vermos
Nossas imagens refratadas nessas bolhas de prata que são
Tempo
Universo

Ou o que deles conhecemos – antes de cada ínfimo, solitário
Apocalipse pessoal.

3/18/2012

daqui (repara

os vermes sob os lençóis, duas
décadas, vinte a quatro meses e estes dias – três
vezes sete
anos e mais algumas mortes retidas nos poros
do tecido em que os restos da pele impressa pelo arame
farpado das horas se escondem
levando versos consigo feitos cinzas)

3/17/2012

Um rosto, ausente
Aqui
Próximo, no sonho
Não dentro
Da mente
Por fora, no espaço
Inexistente
Criado pela ausência
De um rosto
Que produz
A própria luz
Aqui, no escuro
Um rosto, um calor
No espaço entre
Mente e quarto

Onde está a luz
Vela, no pavio
Nos olhos: sem olhos
Onde estaria
A luz no pavio

Um rosto
Uma presença
Por dentro
Da mente – a mente
Que está por fora
Não há dentro
Da mente, a mente
Está fora
Do espaço.

Um espaço, assim
Uma luz, um calor
Um rosto
Sem face
Alguém
Que te abrace:

O ar que você
Respira, não quando
Dorme, mas por dentro

Do sonho. O rosto
De quem
Aqui

Não está.

3/13/2012

daqui

a âncora é o corpo, o fundo
não se sabe Morto pela água
das décadas o Homem
-Aranha considera riscar
na areia fina com a ponta
em riste da última fratura
exposta o seu poema
mais abissal: vês? Ninguém

3/10/2012

HOMO SENSIBILIS E SOCIEDADE CIVIL

Ecce homo sensibilis
que se emociona até as lágrimas
ao ver o pôr-do-sol no horizonte fétido e poluído
de sua varanda gourmet.
Eis o homem sensível
que potencializa seu falo
ao engolir pílulas azuis, KY e camas giratórias.
Ei-lo,
em sua prazerosa busca pelo acúmulo de artefatos,
pets,
crianças e baby sitters.
Eis o homem de hoje
que adora risos,
choros,
sustos,
e adrenalinas.
Ele é só pele,
só visão,
só sen-sa-ção.

Mas, esse homem,
tem a nuca curvada e o ventre dobrado
- gravado -
com a marca inconfundível do desejo.
E, por isso, se percebe na corda bamba
entre os precipícios.
Ele implora, em sua liberdade,
por alguém que o proteja.

E dá as mãos.

Em troca,
deve tecer seu casulo de fibras óticas e SMS,
- ponto luminoso
entre as ondas de
wifi.

3/02/2012

O que você quer dizer com

“anjos” quando você diz
anjos pode ser qualquer coisa saindo
da sua boca: crianças comendo amendoim na porta da igreja; bonecos de plástico no céu
do shopping center; asas de páginas emboloradas de velhos dicionários; muros invisíveis em portas abertas; bolhas que brotam de pedras; todo tipo de chantagem, enfim
somos contingência e quando um lance repentino cruza o tempo, como um clarão, “anjos”
anjos não residem em bonecos de argila e nem seguram vela
pra poetas à procura de eloqüência e nem podem ser colecionados pregados com alfinete, de asas abertas em caixas de insetos; não peça nada
aos anjos, nem mesmo que enfeitem suas palavras, ou sequer
seu torpe
cotidiano.

“anjos” anjos podem ser qualquer coisa – sua natureza é o instante, um momento

íntegro
de lucidez.