11/28/2012

Você pode dizer que escolheu a solidão. Mas e as pessoas translúcidas neste fim de tarde, e a certeza noturna de que o mundo flutua sobre um oceano sustentado pelos seres mais inverossímeis, e os fantasmas que andam armados pelas escolas, e as crianças lendo Mein Kampf nos bueiros, e o amor que se esfacela em ritmos desencontrados. E quando você se senta, olhando para a parede, e o quarto todo é uma inteira pétala incendiada – e só assim, nessa cápsula de silêncio, existe uma vaga promessa de sentido.


11/14/2012

OS CARALHOS DE SHARON OLDS
















OS CARALHOS DE SHARON OLDS




os caralhos de Sharon Olds
são iguais
aos caralhos de Ginsberg?

estes que fedem e morrem
a tempo, em New York, Kansas
que são chupados

e esquecidos
em quartos podres
de motéis baratos

estes feridos
pela passagem
das águas

que se sabem
a cetins escarlates
cobertos de algodão branco

estes homens nus
que respiram
como peixes em vidro
sufocados pelos céus
marchetados de fumaça negra

que aqui, não se são
se sabem pau, cacete
um membro-falácia

uma glória esquecida
para quem foi mulher
filha, mãe
loba mal-fodida

que em ti,
sobram caralhos na boca
falantes, molhantes

mas que agora,
pendem das mãos
escritos, descritos

soçobrando

em Kansas, Nova York
no vácuo,
em quartos rançosos
em lençóis negros
de sangue e sêmen

no vazio,

no nada, como uma guelra.


(Anderson Dantas, Ilha de SC, 14/11/2012)



11/13/2012

Os sete matizes da suspeita

A mão cheia de anéis tira a máscara com rosto de mulher – outra máscara com rosto de criança – outra máscara com rosto de bandido – outra máscara com rosto de louco – outra máscara com rosto de lobisomem,

animal, pura voz

de dor.

Mão sem veias, com fios elétricos desencapados ao redor dos ossos. Sete anéis em cinco dedos, por trás de tudo isso um matiz de rosa impossível, cor de rosa contraindo-se como sangue sugado por buraco-negro de sete estrelas conjugadas: a cidade é pintada com as cores delirantes do general lírico.

Seu nome consta nas listas de torturadores.





11/05/2012

Jogo do Um Acerto

"Para que eu, um prisioneiro em Uqbar no longínquo século do Levante da Codorniz, pudesse chegar até você, por quantas bocas, ouvidos e línguas este lamento não passou, mudando completamente suas palavras e sentido? Você acredita mesmo que algo sobrou do que acabo de escrever na parede desta cela com meu próprio sangue, e está sendo lido por seus olhos nessa tela de computador?"