12/22/2012

História, aborteira de utopias

A luz do dia filtrada por uma fria substância lunar, fina película cobrindo os olhos.
Alguém deitado em campo aberto pede ajuda apenas pra dizer qualquer coisa
porque esta é apenas a figura irreal do pânico: uma mulher deitada em campo aberto com despojos lunares

não faz o menor sentido, como pensar que astros sombrios projetam forças estranhas que formam um véu sobre a sua beleza e que por isso você é irremediavelmente triste.

Brasília, cidade grave, dos tons graves em punk-barroco aqui não há como ser lúcido sem a sensação constante de náusea, você não faz sentido, é uma coisa estranha nessa paisagem de funcionários públicos, pedra melancólica que parece constantemente cair, vinda de um lugar muito distante.

Nesta noite sonhei com uma alegria vislumbrada em plena sombra.




12/14/2012

Pietá



Desata em tangos, menino
Solta os cabelos e vem
Fluido
Sacudir as árvores brancas
Cantar os males aos berros
Cortar os dedos do homem
Jogar a bandeira fora
Vibrar

Tira a camisa e vem 
Aflito
Seus olhos vidrados
Vertentes
Tangenciam os ventos 
E sulcos
Da paisagem
Lunar 

Somos suas
Todas
Todas as mães e irmãs
Suas
Cantamos seu desalinho
Fazemos sua cama
Seu leito
Para que venha, enfim,
Descansar.



12/05/2012

A última semana da minha vida

Minha força é a fraqueza

Arranco fibra a fibra os meus músculos
Até que só restem
Dois olhos opacos como cal
Dois ouvidos que captam as vibrações do calendário
E uma boca tão derrotada que dele só brotam
Os sons imateriais da mente.

Meus inimigos são anjos
E não sabem.



* * *


Tempo é gestos que abrem precipícios

Você vira o volante à direita pensando no cd que vai gravar

O celular toca na hora em que o médico ia receitar o anticoagulante

Ela desceu mais rápido do que normalmente, eu a encontro no meio do caminho quando o normal seria eu ter passado por ali só

Amanhã pode ser que eu coincida – se houver amanhã



* * *

Com os dois olhos que brotam gotas de pus na extremidade de dois canudos cheios de cerda e lodo, o molusco tateia a realidade externa ao seu exoesqueleto, sua carne frouxa não seria páreo para a força bruta dos peixes e suas bocas de centenas de dentes e por isso ele se esconde por trás de algo que simula a impassibilidade mineral – ele tateia, gira os olhos pelo ambiente, antes de sair de dentro de sua caverna óssea para a caçada. Pois é, o nosso torpe amigo também é predador.
Há predadores em toda parte, inclusive por dentro de sua carne viscosa, nojenta de engolir como um chiclete. Se não foi hoje, vai ser amanhã.
Oceano é destino bruto e sem lei.