5/24/2013

Momentos



Eisenberg entendeu tudo errado.
Mas a pior praga é sempre a seguinte
Icebergs expulsam famílias da Escócia
O contrato eu não leria. Numa boa? Evite.
Se quer ganhar dinheiro, somos vinte.

Fala pra tua amante parar
De estraçalhar minha perna a bicadas
A pensão que eu tive, troco ela por nada
Prefiro zombar do trator do destino
A casar consigo.

Frases como esta fazem frio todo mês:
Agasalhos, sejam bonzinhos que eu me crio
Com vocês.

5/17/2013

Cápsulas vagam no extremo vazio, bolhas sopradas do que não tem começo ou fundo: a deusa noite é uma fenda no abismo do oceano de éter. A película é tão fina que não impede a travessia de estranhos influxos.
O seu modo muito particular de sorrir, o percurso das lágrimas que caem na sua blusa como estrelas que morrem.
Tudo tão sutil e transparente e oculto pelas distâncias infernais. O sublime é o que não pode ser medido. O universo é mais transparente do que o breu absoluto. O tempo estourará como uma água-viva contra os limites da realidade.
Dentro da mínima cápsula, o tirano presenteia o filósofo com um elefante. O dissecador de flores.
Não há ponte visível entre a realidade grotesca e a geometria desses corpos abstratos.

5/11/2013

A luz tateia meu rosto
sem olhos,
o vento me aninha

respiro pela pele.

Não há dor nas raízes
que arranham minhas pernas
mergulhadas no húmus

Vida é ritmo de pouso
e procura:
a terra será fecundada
com o pó alucinógeno
que brota dos meus cabelos.

Multidões marcham

eu nada testemunho.

De sangue e água
só conheço temperatura.

Tenho minha própria lentidão
e morro subitamente.

Da história,
nada sei nem saberei.


5/03/2013

Vistas planas do que é a Casa

1. Vingança gratuita

Em torno do homem, um casulo humano. Quando você sai à rua, a casa inteligente perde preciosa chance de te administrar. É o quarto do pânico, um desejo pueril de segurança. Confessá-lo parece despertar da súcia a malta, conjurar o que à alma baixa, e mesmo disso sentir falta.

Mas até uma casa inteligente tem pontos de treva nos sistemas, ausências em traumas terríveis. Se um dia o quarto o acondiciona na porta da geladeira de ovo virado, pode esperar: a vingança gratuita vem do ambiente, onde menos você se sente.

2. Para iniciantes

Esperava nesta sombra à parede um registro do espectro da lua, as águas todas nos copos da casa indo embora com a maré. Isso quando menos você vai encostada, salvando uma vida a dois na mobília da enchente. Você aprende! Cante com a gente.

Há muito tempo gente se casa, os pais da família reúnem dinheiro e dão dote. Tal hábito proliferou em tantas castas de casas gastas, atulhadas de desejos que cada filho fizesse o mesmo. Hoje todos compreendem por que cobram fazer isso, planos tão longe projetados como um eco a partir da boca: "patrimônio, tu és a mola-liga da família".

3. Onde foi mesmo que eu deixei a chave?

Apertem um botão pra checar se o milquicheike nessa casa não tem vida própria. Sem grana pra sequer pensar em cromaqui, objetos solitários se movem segundo a lei de sua atração: é pegar ou largar. Cumprindo o que trabalhos mais conscientizados não tentam porque não são devidamente valorizados, duvido que nessa noite fria sejam esquecidos de lado. Técnica, dai que esqueçamos que você existe. Até nas teorias.

Ficaremos, pois, com o resto. Uma noite, conosco fora para a semana, a casa pode dormir. Sonhar. E nós, imagina, fazendo o devido desespero dos garçons em certos restaurantes. Duvida? Bate um fio direto da minha residência, nem anota o endereço - porque eu vi um movimento ao sair, era você que chegava aqui.

4. Com cinco ou seis retas

Saiu pela escada da moça pelada. Consegue ouvir com essa droga? Tóing-tóing, é a mola. Perdida num degrau da escada, eu nem dou bola. Tou com fome e é uma praga, com esse tempo úmido até na barriga a comida estraga. A casa fica na beira de uma estrada. O mundo corre em volta, fluindo à revelia mas olhando de soslaio ao homem, seu eterno adversário.

Olha o crepúsculo na abóbada: é uma passagem - no casulo está pintada esta paisagem. Apenas uma concha de molusco à beira-mar.

5. Inventário

Está lavrada ao lado a escritura. Quem deterá o roteiro da minha figura? Ao contrário de todos os meus amigos, sou muito solitário. E silencioso. Falar de outros, com os outros, me dá nervoso. À minha chegada no advogado, mãos da família me recebem jogadas ao ar. "Ficar com a casa? Eu nunca vou deixar!!!"

O colarinho quase o sufoca. É medo de exagerar. Nunca lhe deram nada, um estrago no assunto dos outros - ah, isso sim ele tem de deixar. Leva sob os braços as memórias dos encontros, brincadeiras no quintal da infância. Pode parecer apenas um número nos papéis, e que o revolto episódio de herdeiros se deu por incidente. Mas o que é sério, mesmo fugidio, fingindo a gente sente.

(para Wlademir Dias-Pino)



5/02/2013

Mais do planetário de bolso


Marte
Toda vez que passo, uma mecha de cabelo de alguma mulher morta se gruda nas minhas costas. Ventosas: meu corpo cada vez mais anêmico, coberto de pelos vermelhos. Polvo bélico, cápsula de aço orgânico, tentáculos fisgando o seu pesadelo. Aranha vermelha em camisa preta, um leão agoniza no minizoo, lentamente feroz. O meu rastro é feito de partículas do meu corpo, mês desgasto e me renovo, sempre originário. Sou traiçoeiro como um monstro triste, uma flor cheia de dentes, escrevo como quem tatua gritos no papel. A cada vez que te assassino você se sente vítima de ódio, mas é a tristeza que me lança em agressões repentinas – deus me armou como quem monta uma armadilha.

Mercúrio
Só existo enquanto caricatura em teus olhos perspicazes, você inteiro em si mesmo. Existe um preconceito muito forte separando você de mim. Eu que entre a tristeza e a tristeza não encontro um caminho natural. Vou deixando heráldicas como rastro, vestígio e sinal de que nunca estive ali: mão de ferro empunhando um dragão (de pano). É o destino dos pequenos, ser uma lágrima a mais na face definida dos imensos, o seu riso invulnerável, um desperdício do tempo. Você íntegro, claro como um rosto nu, que nem mesmo precisa de máscara porque não há istmos abertos pelas unhas afiadas da vida entre seu juízo e o que vai entre seu juízo e o juízo final. Você, o monólito com uma sombra de falsidade: euzinho aqui, caricatura do humano. Seria você o caricaturista? Só o incriado não é caricatural, sou tua criatura, um animal de estimação, uma repugnância necessária antes de verniz do seu engodo, a falácia que convence sua verdade, a maldição exemplar que dá aos abençoados a certeza de que sua bênção não é uma desgraça camuflada? O que seria do mundo se todos fossem verdadeiros e solares como tu?