5/02/2013

Mais do planetário de bolso


Marte
Toda vez que passo, uma mecha de cabelo de alguma mulher morta se gruda nas minhas costas. Ventosas: meu corpo cada vez mais anêmico, coberto de pelos vermelhos. Polvo bélico, cápsula de aço orgânico, tentáculos fisgando o seu pesadelo. Aranha vermelha em camisa preta, um leão agoniza no minizoo, lentamente feroz. O meu rastro é feito de partículas do meu corpo, mês desgasto e me renovo, sempre originário. Sou traiçoeiro como um monstro triste, uma flor cheia de dentes, escrevo como quem tatua gritos no papel. A cada vez que te assassino você se sente vítima de ódio, mas é a tristeza que me lança em agressões repentinas – deus me armou como quem monta uma armadilha.

Mercúrio
Só existo enquanto caricatura em teus olhos perspicazes, você inteiro em si mesmo. Existe um preconceito muito forte separando você de mim. Eu que entre a tristeza e a tristeza não encontro um caminho natural. Vou deixando heráldicas como rastro, vestígio e sinal de que nunca estive ali: mão de ferro empunhando um dragão (de pano). É o destino dos pequenos, ser uma lágrima a mais na face definida dos imensos, o seu riso invulnerável, um desperdício do tempo. Você íntegro, claro como um rosto nu, que nem mesmo precisa de máscara porque não há istmos abertos pelas unhas afiadas da vida entre seu juízo e o que vai entre seu juízo e o juízo final. Você, o monólito com uma sombra de falsidade: euzinho aqui, caricatura do humano. Seria você o caricaturista? Só o incriado não é caricatural, sou tua criatura, um animal de estimação, uma repugnância necessária antes de verniz do seu engodo, a falácia que convence sua verdade, a maldição exemplar que dá aos abençoados a certeza de que sua bênção não é uma desgraça camuflada? O que seria do mundo se todos fossem verdadeiros e solares como tu?

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