5/03/2013

Vistas planas do que é a Casa

1. Vingança gratuita

Em torno do homem, um casulo humano. Quando você sai à rua, a casa inteligente perde preciosa chance de te administrar. É o quarto do pânico, um desejo pueril de segurança. Confessá-lo parece despertar da súcia a malta, conjurar o que à alma baixa, e mesmo disso sentir falta.

Mas até uma casa inteligente tem pontos de treva nos sistemas, ausências em traumas terríveis. Se um dia o quarto o acondiciona na porta da geladeira de ovo virado, pode esperar: a vingança gratuita vem do ambiente, onde menos você se sente.

2. Para iniciantes

Esperava nesta sombra à parede um registro do espectro da lua, as águas todas nos copos da casa indo embora com a maré. Isso quando menos você vai encostada, salvando uma vida a dois na mobília da enchente. Você aprende! Cante com a gente.

Há muito tempo gente se casa, os pais da família reúnem dinheiro e dão dote. Tal hábito proliferou em tantas castas de casas gastas, atulhadas de desejos que cada filho fizesse o mesmo. Hoje todos compreendem por que cobram fazer isso, planos tão longe projetados como um eco a partir da boca: "patrimônio, tu és a mola-liga da família".

3. Onde foi mesmo que eu deixei a chave?

Apertem um botão pra checar se o milquicheike nessa casa não tem vida própria. Sem grana pra sequer pensar em cromaqui, objetos solitários se movem segundo a lei de sua atração: é pegar ou largar. Cumprindo o que trabalhos mais conscientizados não tentam porque não são devidamente valorizados, duvido que nessa noite fria sejam esquecidos de lado. Técnica, dai que esqueçamos que você existe. Até nas teorias.

Ficaremos, pois, com o resto. Uma noite, conosco fora para a semana, a casa pode dormir. Sonhar. E nós, imagina, fazendo o devido desespero dos garçons em certos restaurantes. Duvida? Bate um fio direto da minha residência, nem anota o endereço - porque eu vi um movimento ao sair, era você que chegava aqui.

4. Com cinco ou seis retas

Saiu pela escada da moça pelada. Consegue ouvir com essa droga? Tóing-tóing, é a mola. Perdida num degrau da escada, eu nem dou bola. Tou com fome e é uma praga, com esse tempo úmido até na barriga a comida estraga. A casa fica na beira de uma estrada. O mundo corre em volta, fluindo à revelia mas olhando de soslaio ao homem, seu eterno adversário.

Olha o crepúsculo na abóbada: é uma passagem - no casulo está pintada esta paisagem. Apenas uma concha de molusco à beira-mar.

5. Inventário

Está lavrada ao lado a escritura. Quem deterá o roteiro da minha figura? Ao contrário de todos os meus amigos, sou muito solitário. E silencioso. Falar de outros, com os outros, me dá nervoso. À minha chegada no advogado, mãos da família me recebem jogadas ao ar. "Ficar com a casa? Eu nunca vou deixar!!!"

O colarinho quase o sufoca. É medo de exagerar. Nunca lhe deram nada, um estrago no assunto dos outros - ah, isso sim ele tem de deixar. Leva sob os braços as memórias dos encontros, brincadeiras no quintal da infância. Pode parecer apenas um número nos papéis, e que o revolto episódio de herdeiros se deu por incidente. Mas o que é sério, mesmo fugidio, fingindo a gente sente.

(para Wlademir Dias-Pino)



Nenhum comentário: