2/22/2010

O mercado é madrasta

1.
as roldanas haroldianas

(seu sacana, filhodaputa e derridá)

os derrisórios derridianos
os freiráticos freyrianos
o amar marioandradiano

(fodeu a árvore, seu malandro)


o mad max marxiano
a grama gramisciana
a bodurna bourdiana
a foca foucaultiana
o heil heideggeriano

(coçando o queixo qualquer
publicitário vira artista ao passo que eu
claudico sem uma nota de rodapé)



2.

acumulação primitiva de citações:

(meu estilo é cheio de si,
quem escrevi isso aqui?
é meu tudo o que pioneiramente
tive a idéia de copiar,)


3.
o cu do cool do caderno cultural

deleuze me livre!
kafka é uma comida árabe,
cabala é uma boate no rio de janeiro,
drummond é uma estátua sem óculos,
homero foi um cego que nunca existiu,
machado de assis enchia lingüiça
pedro álvares cabral de melo neto era gago
(conforme Sebastião Nunes)

Goethe escreveu um livro chamado Faustão

(“um século de leitores e até o espírito
vai feder”, Nietzsche &
quando eu disser que procuro um amor
leia-se
procuro um tema pra meu novo livro)

para o interior do contra a história oficial
a moderna reflexão da complexa questão
do sim do não talvez como o fio condutor
da poética das fricções do silêncio
do nada do vesgo do vazio
caindo no abismo do indizível.

2/21/2010

Sem título

Eu diria coisas interessantes, te elogiaria na medida certa, sem aquela coisa de ficar babando, você riria bastante, não haveria nada nas entrelinhas, no final de tudo você me beijaria e me daria o pouco de carinho a que eu fizesse jus. Eu não comentaria aquela coisa sem nexo que gente e cachorros é que podem ser filhos da puta, gatos não. Eu não acordaria numa ressaca daquelas, a situação é cômica baby. Na vida real não chamo ninguém de baby, é brega pra cacete, mas pensei nisso por causa daquela música, você precisa saber da piscina, da carolina, da margarina, baby eu sei que é assim etc. Você ia gostar se eu cantasse pra você? Ou ia achar uma puta xaropada? Na vida real eu não canto, não precisa se assustar. Hoje de manhã a gata que mora comigo, gato da espécie dos felinos mesmo, estava miando de um jeito meio esquisito, fui olhar e ela estava miando pro espelho. Será que ela está passando por aquela fase lacaniana? Pensei. Mas que papo mais sei lá, hein baby. Então como eu ia dizendo, a situação é cômica. Eu, numa ressaca escrotíssima e tenho que sair de casa. Por quê? Dá um pouco de vergonha falar, mas vá lá, você precisa saber do que se trata, acho que sou um otário, é porque minha ex-mulher quer ficar umas horas com a gata e usar a impressora. Minha ex, a gente se separou tem umas três semanas, ela saiu de casa me dizendo que meu sangue não presta, que não devo reproduzir minha miséria. Ela disse que queria ter filhos comigo, apesar disso. Não entendi a segunda parte, porque meu sangue não presta mesmo. Você acha que eu pensei que ia te fazer rir com essa autocomiseração? Não pensei nisso, conversaríamos sobre outra coisa. Também sou contra ressentimento e detesto quem usa literatura como álibi, to pensando numa merda de um livro que li tem pouco tempo e como o escritor pediu pra comentar falo aqui, só pra você, ele tem a cara de pau de dizer que só escreve obra-prima, tudo bem, ele escreveu duas e isso bastaria pra qualquer um e tirando o clichê que o fulano também usa pra se esconder eu até diria que isso não é literatura, é uma carta. O papo é que não me deu vontade de falar nada e hoje estou aqui de ressaca e por isso imaginei como seria se a gente tivesse conversado e você me beijasse somente a título de boa noite. Pois é, não sei se curti aquela sinuca subterrânea. A música era boa, mas tive um ataque de piedade por todos que estavam lá. Tudo muito escuro, o ambiente meio avermelhado, os jornalistas comentando que a juventude de Brasília já foi melhor. Deve ter sido na época deles, como os mortos gostam de dizer. Pois é, catacumba. Mas, tirando isso, foi divertido. Uma hora eu estava sentado pensando em nada e você me olhou e sorriu, fez uma mímica como se estivesse tomando uma pílula, você achou que eu estava drogado?, eu sou assim mesmo baby. Na hora que você foi embora apontou o dedo pra mim e sorriu de novo. Não entendi a mensagem, só achei tudo muito bonito. Não quero interpretar, pra não parecer pretensioso ou expor autopiedade – vivo nesses extremos, baby. Melhor deixar quieto. Todos de ressaca, estou fodido. Vou ter que sair de casa, não sei pra onde, nem com quem. Domingo sozinho é foda, só tem famílias nos restaurantes você sabe. É dia de ficar em casa. Mas eu tenho que sair, não sei pra onde. Acho que vou dar um pulo na biblioteca, mas estou completamente sem cabeça pra ler. Eu cheguei em casa umas seis da manhã, dirigindo, pensando numa poesia que escrevi tem um tempo, digo que é uma merda talvez por vaidade, não é tão ruim assim, mas também não tem nada demais, a poesia termina assim: a única beleza espontânea desse dia foi aquela que aumentou sua solidão.

2/17/2010

Carnaval na caverna

Alegria desesperada
No ar, passa ao largo,
Sobrevoa
Como um avião furtivo ao radar

Sobre seu alvo.

Cheirando o etéreo num lenço
Aspiro a alegria de um sopro
No coração
O nada que me desobrigará
Da sua felicidade plena
De violência das risonhas dentaduras
Desenhadas no radiador do avião

Alegorias mordendo minhas canelas
Minas subterrâneas do prazer imposto:

Vomito o carnaval na caverna.

2/15/2010

O que não quero dizer sobre os anjos

Enquanto tagarelo, estrangulando as coisas do mundo para experimentar a distinção entre certo e errado, antes de tudo quem está certo e quem está errado, cuspindo convicções –

É nas palavras que finjo acreditar na vitória

Das derrotas, a arte da guerra para um falido na fragilidade das palavras que recobrem o mundo como uma fina superfície – a sua realidade, talvez,

E invento desculpas para explicar porque somos fora de foco e só como discursadores vencemos ou julgamos vencer, à revelia do resto

Que é tudo o mais.

Quanto aos anjos, é da natureza dos anjos falar pouco, quase que por sinais, o passo leve, toda a atenção dedicada à lanterna que acendo na noite como pedagogia da distância, enquanto o anjo me ensina a suave proximidade de quem finge aprender, ainda mais que anjos não aconselham, escutam.

Enquanto vocês precisam de seres alados impossíveis, auras e demais pretextos teológicos e éticos, a vida ou a morte, o caminho reto, não vendo a proximidade dos anjos, em simplicidade, silêncio e ausência

De promessas ou perguntas e negamos a clara existência dos anjos, só por não serem

Sobrenaturais – da mesma forma que o milagre é direto e simples, a mão estendida para a amizade, a chuva que transforma este habitat de underground supralunar em leve paisagem marinha.

2/10/2010

Sanguezinho de merda (ou, ela disse-me assim)

No início, deve ter rolado
A transfusão de sangue de um buraco negro.
Sangue verde-escuro, de musgo, sangue frio
De anfíbio.

Sabe-se lá quantos estupros nas gerações de orgulhosos
Masoquistas, melancólicos de sangue de sombra, um litro
Gostoso de sangue de mitômanos, místicos, seres sem imaginação,
Da repetição, sangue sem tragédia, sangue de beata virgem,
Afinidade eletiva com álcool, com os excessos, sangue compulsivo,
Bipolar, histérico e esquizofrênico, sangue de puta, sangue amarelo
De bílis, sangue de papel, de alegria desesperada, que cultiva
A tristeza como se a derrota fosse um tipo de retiro espiritual,

Não basta ficar contente, tem que destruir o bar com os amigos,
Não basta ficar triste, tem que contabilizar jazigos,
O show não está bom? Joga latas de cerveja nas backing vocals.

Nem mesmo o hábito saudável da leitura
É saudável quando imerso num sangue porcaria desses,
É leitura compulsiva, delirante, desordenada e degenerada

(Ao invés de Sítio do Picapau Amarelo, por onde começaram
Todos os colunistas culturais, O Presidente Negro e os tratados
Eugênicos do Monteiro Lobato, sangue de chacota, só pra
Dizer que Lobato e Xou da Xuxa é a mesma merda)

Sangue ácido, sangue pinguço, a mãe natureza vai
Acabar com isso recitando a fábula da semente, mas no seu caso
É a semente que é seca, imprestável e pecadora.

2/06/2010

...

um labirinto que a vida lhe propôs no instante mesmo em que você andava e via no horizonte um ponto aceso - não tem saída agora: de um lado a verdade; do outro, o esquecimento, a desrazão, o incêndio que rouba o sentido ao passado e aí você desconfia que as duas saídas são a mesma, refletida - a verdade lança seus urros de fera e pelos ecos você pode adivinhar a sua essência - não o sentido, porque este não existe - não há também surpresas e é quase como se sentar ou caminhar fossem o mesmo - seriam essas as obras de deus? forjar enigmas que nos lança convertidos em labirintos, como se uma coisa pudesse sempre desdobrar-se em outra, ser outra, parecer outra? talvez por isso você se vingue escrevendo nas paredes grafites mesmo que no labirinto a língua seja de cada um, só de cada um, e ninguém decifre o que pulsa embaixo dos traços – é aí que você berra pros céus mandarem mais paredes cinzas, mais paredes cinzas, mais paredes

2/02/2010

Entrar - sair - do - no - inferno

Você é um pretenso filósofo um pretenso poeta um pretenso outsider um pretenso professor um pretenso qualquer coisa da mesma forma que os outros estão pretensamente alegres pretensamente tristes pretensamente na sua, quer dizer na deles, em suma o Inferno é mera pretensão como outra qualquer, não interessa qual é a sua das máscaras que são pretexto de música que é pretexto de vida que é pretexto de longas caminhadas que são pretexto de morte que é um pretexto do Inferno que é um pretexto de você que é um mero pretexto, quer dizer talvez um mágico faça sumir o gato do apartamento como pretexto tardio e isso vai se repetir inúmeras vezes sempre como pretexto de outra coisa, você vai dizer que não era bem isso o gato pode ter sido enforcado, deixa eu dizer de novo de outro jeito, agora vai mas vai se repetir como os erros de uma máquina estressada, assim:

A sua língua é subliminar, todas as línguas são subliminares na montanha-russa supralunar, não estamos falando de torre de babel, certo?, não tem nada a ver, estamos falando de onde tudo o que se diz é pretexto de uma música inexistente, não há música nos ruídos, mas eles querem dizer alguma coisa ou você quer dizer alguma coisa naquilo que eles poderiam querer dizer, você não é um compositor sacramentado, você às vezes não suporta os ruídos, quer dizer “conversas”, eles têm que ser combinados como se alguém mudasse aleatoriamente a sintonia do rádio e isso, no final das contas, desse como resultado alguma música, algum esboço de música que é, aí está, quer dizer o Inferno, esta música dos diabos

Você pode inventar algo assim como uma montanha russa platônica e tecer comentários sobre a esfera de cristal, o éter, isso como alegoria, será mesmo que não é literal?, sobre a natureza líquida do tempo etc, os outros pensam que ele deve estar mentindo, cheio de pretensões ou pretextos, vão te filmar e colocar no youtube pra você ver lá o seu fantasma que (como todas as aparências) não mente, quer dizer mas a questão não é quem está fingindo e sim o que está sendo fingido quando todos estão fingindo, se todos não caíram, com você, dentro daquela velha história do mentiroso que só engana a si mesmo, o mais dantesco dos otários

Outros vomitam. Você sabe: é seu o vômito deles e as aparências (por isso, os fantasmas) não mentem, quer dizer

Você pode caminhar à vontade neste lugar em que nada muda de lugar você vai ter a sensação de caminhar em círculos mas aqui não há círculos você caminha em linha reta, para onde?, com sede, uma sede tão profunda que te faz criar caretas, taí, você virou uma caricatura, mas é aquela velha história da máscara que esconde o que mesmo? nada e do pesadelo de uma pessoa que bebe água, mas a água é ar e a sede continua e a pessoa acorda e percebe aliviada que era apenas sede mesmo e vai beber água e percebe que a água virou ar de novo, quer dizer as tais máscaras que ficam grudadas na cara, como as aparências (por isso os fantasmas) não mentem

O Inferno não está para além da vida, está logo abaixo da vida, é o que sustenta a vida e permite suas caminhadas e devaneios, o Inferno não é um castigo, é mais um pretexto para redenções súbitas e passageiras, isto é, pequenas passagens para o Paraíso, que também, por si mesmo, não é nada, sendo o Paraíso um pretexto do Inferno – ambos, pretextos da Realidade que por fim não é nada além de ruídos que solicitam, conclamam, forçam a barra no sentido de que alguma melodia saia desse vômito todo

Por exemplo, e isso é literal, você pode pensar em mergulhar observando com a devida concentração os olhos que ficam negros quando ocultos por uma máscara dourada – não se trata de uma máscara “poética” de um carnaval veneziano – e a garota que está usando a máscara não simboliza nada, além de ser bonita, nada de metáforas, por favor, trata-se apenas de uma forte variação de eletricidade, um curto-circuito como aquele que te fez desviar os olhos quando você ainda estava pretensamente em si, no pleno controle de suas (risíveis) capacidades então você resolveu se preservar, quer dizer hoje não, ainda sinto uma pedra, quer dizer uma perda, na boca do estômago e agora momentos depois você caiu no limiar dos olhos que devem estar por trás da máscara, já que é pra brincar de pop cult cite o campo gravitacional das naves em guerra nas estrelas, você se lembra quando ela tirou a máscara, foi antes de tudo, naquela hora em que tudo era pretexto, mas no exato instante em que, em que mesmo?, alguém grita e os seus (quer dizer, não os dela) olhos explodem

Você por um momento pensa em como seria bela uma recaída romântica, numa hora dessas?, e cantar a luz negra de um destino cruel ilumina esse teatro sem cor onde estou representando o papel de palhaço do amor e ri notando o que poderia ter de literal nisso tudo

Agora se o seu amigo te revelar que enfim você está morto há uns dez minutos, e um seu brother não mentiria numa hora dessas, e você sabe muito bem no que isso vai dar, em nada, porque tudo é alegoria (principalmente o Paraíso, o Inferno e a Realidade), aí você está frito rapaz, você definitivamente estará morto, até quando

Não é nada disso o que ele diz

Não me venha com essa você pode se lembrar do Dom Quixote que não via um elmo no lugar de um penico ele dizia que aquilo era um elmo enquanto para os outros aquilo era um penico, aquilo não é nada além de aquilo, mas aquilo não presta pra nada, é como vômito, ao contrário de elmo ou penico que não existem, mas, sei lá, servem pra alguma coisa, você não serve pra nada como a perda não serve pra nada e nem mesmo as máscaras servem pra nada, o que não impede que Dom Quixote seja ou aja como ou fingisse ser um louco, como numa doença psiquiátrica cujo sintoma é fazer-se de louco, a loucura de quem pretende ser louco, ou aquela frase tipo Napoleão Bonaparte foi um louco que acreditou ser Napoleão Bonaparte, ou como diria um desses psicólogos de poltronas televisivas, cada um vive a sua fantasia

Para os outros você e seus erros visíveis e risíveis é um lance inesperado, do seu ponto de vista, você e seus erros risíveis e visíveis, ah não, isso é inacreditável, quer dizer, por fora a surpresa e por dentro a perplexidade com as suas cagadas e você sempre achou canastrão e ridículo o choro simulado sem lágrimas e agora você está no Inferno e não tem lágrimas para chorar e melhor não falar de perdas, quer dizer derrotas, mas é só disso que você está falando, certo?, nas entrelinhas é isso, ponha mais essa na conta do vômito, de qualquer coisa que seja aquilo, melhor não comentar, aí é que você se engana, o Inferno não é o amor que ainda ontem se enforcou com o próprio cinto e deixou um bilhete tão cheio de revelações como não se esqueça de pagar a conta da luz etc, o papo é outro

Você estará grunhindo quando disser que são todos porcos

E todo esse egocentrismo, peraí, não vai dar em nada, você vai sair do Inferno como entrou, de mãos vazias, e quanto aos pequenos paraísos e pelo menos a eletricidade, é isso aí, nada vai dar em nada, você vai ser, na pior das hipóteses, uma paródia, um pretexto, algo assim como o sábio da montanha, na melhor uma sabedoria possível seria ficar nos ruídos sem procurar uma música, mas a partir de então você só falará por ruídos e mais uma vez sua sabedoria será inútil, e se isso fará de você um santo, um otário ou um xarope tanto faz

A festa foi boa, uma festa dos infernos

2/01/2010

Tédio (com cheiro adolescente)

O tédio constrói nossos divertimentos breves, nossos aparelhos inúteis, nossos shopping centers de estreitos corredores (o maior divertimento em um shopping é acotovelar-se com os idiotas), enfim, nosso vazio com cheiro de merda. Não, eu não quero ler o último best-seller de auto-ajuda no último iPad, ele é uma porcaria (o aparelho). Minha única auto-ajuda é o salário, que, ao desferir a lâmina do cartão nas devidas fendas, me faz lançar esporros de dinheiro pelas veias do sistema econômico, realizando meu gozo, que só dura alguns segundos. Logo depois, coloco toda minha raiva pelo gozo instantâneo num canto qualquer da minha existência, com cheiro de merda.
O contrário do tédio não é o trabalho, nem o ócio criativo, pois não criamos mais nada que possa ser vendido e reconhecido em nossos momentos de ócio. O trabalho me deixa com vontade de dormir e, quando durmo, sonho em trabalhar. O trabalho esvaziou meu cérebro e me preparou para o tédio sacrossanto de todo final de semana, cheirando a merda pelos quatro (ou três) cantos da casa.
Mas, se eu grito “Entretenha-nos!” com os pulmões cheios de ar podre, por que os outros precisam me entreter? Sento na minha tediosa cadeira, olho para a TV, limpo a baba idiotizada da minha contemplação tediosa e começo a pensar. Inicia-se, assim, a fábula do último Prometeu.