2/25/2007

nº 24




A mais valia do Amor, as esperanças
naufragadas, lábios que operam delícias e me levam
quase ao paraíso, o som úmido e escuro do desejo
triscando na loucura, a cara contra o chão, os delitos da alma.
O paraíso era dentro de mim, mas eu
o demoli
com golpes secos, duros, ritmados. Armei um plano
e perpetrei vilipêndios contra suas paredes brancas, minhas,
tão brancas, fiz bezerros de ouro, e agora posso me dizer que sei
quem nunca fui.

O esquecimento bem podia ser a Terra Prometida.


(das Notas Marginais)

outras coisas

juntos a outros
passagem

cultivamos
um vinho

que está
além

não há mais
cavidades

a explorar

próximos
ao fato

de que
é bem improvável

a saída

no beco
entreolhamos

os mesmos
ratos

d´antes
num mergulho

vivo
e sem gosto.

* * *

Entre o mundo e eu
Um arame, apenas
Ligando minha garganta
A um satélite no céu.

Sob o sol que vejo
Vomitando-se em cores
Da montanha (verde-macacita)
Ao posto de gasolina (azul-vermelho-amarelo-plástico)
Ao asfalto (cinza-preto-vapor)
A meus braços

Que me concentram
Numa direção, como dínamos
No instinto de um inseto
Um arame
Apenas
Um nome piscando
Distanciando-se, sumindo
Enquanto os buracos da estrada
Lembram uma língua
Cheia de carrapatos

Eu, meus pés, meias de lã













Está tudo espalhado por aí:
nossos sonhos, meus dizeres, seus brinquedos.
As panelas no fogão estão vazias.
Os lençóis fora da cama: bolhas de vento.
A pia: louças brancas e talheres azuis.
Está tudo por aí, sem lugar.
E você chega.

Eu preciso que você me ajude a desarrumar a nossa casa.

2/24/2007

Coisas

Um olhar passa. A alegria pro espaço. Óculos que serão consertados. A bateria do telefone sem fio que será trocada assim como os lençóis. Branco branco branco. Senhor do universo. E agüentar esta passagem pelo vácuo onde você já não está. Suas palavras borradas se transformam em coisas. Outras.

2/23/2007

Cenas de uma cidade qualquer 7

No começo foi mistura de curiosidade e medo. Um gato explorando o móvel novo no apartamento. O carro-família devagar na avenida. Carro prateado no sol insuportável. Faca sorrindo sobre a mesa da cozinha. Temperatura ambiente criando um vácuo ao redor da família feliz. Na cidade o gavião ainda sabe onde se esconder, a não ser quando é raptado e metido no quartinho de empregada. A força vital de milhares de corpos pulsando levam o carro adiante. A cidade espalha.
Depois, quando me aproximei, foi o pânico. Meu e da família, embora só se fale dela. A família repudia a violência, defende a cidade harmoniosa. O nome disso é instituição. Filósofos vão dizer do meu ato assassino que houve alguma falha na razão, que em mim o homem regride aos estágios incivilizados e só faz o que o corpo manda. Os primeiros seres vivos eram escravos do Medo. Muito frágeis, qualquer pontinha de luz ou calor para eles era o fim. Por isso se agarravam à vida compulsivamente, matando tudo. Psicanalistas dirão do meu caso que o medo é perturbação na via da pulsão de morte, herança ancestral das bactérias que sonham se tornar pedras, depois que Freud se desiludiu com o Ocidente. Serei enfim a aberração. No carro decepado, sem brilho perto do matagal, o showman perguntará o que no mundo deu errado em mim.
Daqui da janela agora assisto a passeata das crianças que pedem justiça. Justiçamento, vingança. A raiva dos vencedores alimenta a instituição. A guilhotina foi sinal de liberalidade, morte indolor. Esta janela aqui apresentada e o espaço amplo do meu quarto vêm a calhar porque jornais dizem que me enviaram a um hotel. Bárbaros não sabem economizar o freegobar. Não sei o que estou fazendo aqui, não sei se estou aqui. Meu nome é Gaúcho, estive na Ilha Grande em 1936. Um escritor achou muito natural que um macaco como eu me habituasse à cloaca: este lugar escuro, úmido, onde as pessoas se dissolvem numa pasta fedorenta, sempre teria sido meu habitat natural. Mas jura a criminologia: animais também cometem delitos. Existem felinos assassinos, que não matam somente para comer, mas por bestialidade. Em mim, a natureza fez uma curva. O carro-família é um direito sagrado. Cortei a foice todos os sonhos. Sou um enigma renegado.

2/20/2007

peixe grande

trouxe seu pincel
à beira
da praia

e pintou tudo de lilás
esboçou um grito
latido

ainda que
no silêncio
o pote

de ouro

havia ficado
atrás do morro

um anzol enferrujado
não puxa
um corpo

e as horas
acabaram
por cima

das portas
e janelas

amanhece.

Duas Cidades

Lá: clarão artificial cercado por verde-cinza. Mar aberto no céu em expansão. O horizonte para todos os lados, compondo inclusive o ar e sendo por ele expirado. Como nos sonhos de olhos cerrados, abertos para que outras luzes se soltem na jaula escura.

Aqui: a abertura vai no sentido da profundidade. A saída é para baixo, poço escondido entre fios e cimento. Mesmo não sendo está mais para sertão, um açude cercado por terra rachada. Aqui: a beleza brota no fundo. Não podendo ser respirada exige mineração, desde a construção das galerias até o encontro com a pedra verde.

Aqui: você é translúcido como uma aparição, mas padece como lâmpada dotada de tato.

Aqui: não existem pássaros, apenas ratos voadores comedores de migalhas sem o pudor dos ratos que se escondem em bueiros. Ratos de olhos vermelhos.

Lá: nunca se viu um fantasma (esquecer a conversa dos Palácios).

Aqui: a cidade cresce amendrontando o céu – martirizado, indicando medo. A professora universitária mantém um gavião real em cárcere privado, preso no quartinho de empregada.

Lá: a chuva é anunciada, vem aos poucos e no dia seguinte a cidade abandona o amarelo da sede e se expande totalmente verde.

Aqui: quando a chuva vem, cai com tudo e os sinais de trânsito dizem nem sim nem não, como deuses arcaicos.

Lá: não há mais deuses, dissolvidos na luz.

Lá: quando você olha o céu fixamente seu sangue azula. Mas não no azul da nobreza e sim no azul de sanguessugas secando na secura desértica. O Senhor Ministro encomenda potentes umidificadores para a residência oficial.

Aqui: restos mortais de um imenso jequitibá dourado brilhante representam a pujança do interior. Matronas e Bustos de Família andam esverdeados depois de devorarem milhares de jabuticabas todas as manhãs, ao lado da estátua de Plínio Salgado.

Lá: nos bares, bêbados vomitam versinhos sobre as putas de Brasília.

Aqui: um sujeito com restos de grama na cabeça e um pedaço de fio elétrico amarrado no braço estraga o domingo dos cidadãos – como se todos estivessem bêbados logo de manhã em Campinas.

2/19/2007

nº 11



Racional. Milimetrado. Lixando a esmeril
todos os cravos da paixão que ganem no passado.
Se a carne for embora junto, tudo bem.
A carne é fria e livre, mármore dos deuses,
mas é nela que a memória pulsa, se insinua
e sempre sangra.
Quantas vezes, rijo, armado, masculino,
fui invadindo a carne alheia, sem pedir,
com uma difusa esperança de encontrar o oásis
para a alma.
Eis que o deserto é mesmo tudo,e isso já foi dito.
A um beduíno, sem camelo, caravana, tenda, sem Alah,
na ausência da água,
resta sentar na areia e se abraçar, agarrar-se à própria carne, que a alma,
esta é rebelde e foge sempre ao braço, à mão
humana.

Para esta sede, nem que tudo transbordasse.


(das Notas Marginais)

2/18/2007

Esquiva

ela m e o d i a
luvas, agulhas, sol cinza.

eu a r o d e i o
sombra cega, espelho.

beleza r a r e f e i t a:
a m a r g u r a barroca
summer theologica
d e f o r m o s a pérola.

deus ateu
i n s i n u a – s e o rancor.

p o s t e r g a s m o s:

aodiamos o adeus.

2/16/2007

Espetáculo

O sol tímido (algum anjo autoritário girou no pulso as estações, avisando que o inverno vem vindo) acende um calor frio sobre as cadeiras vermelhas da praça.

Devagar, as pessoas chegam e tomam suas posições. Um pouco de demora, placas com os nomes dos figurantes (todos os presentes) parecem ter sido trocadas. A conversa não flui.

Uma pausa para as refeições.

E justo na hora em que o primeiro ator ia induzir os acontecimentos à reviravolta fatal do deus-máquina, outro anjo (são todos chamados de Evil Pets) escurece o ambiente. E o espetáculo, mais uma vez, fica adiado.

2/14/2007

nº 12


Entre os desastres de amor e as delícias do sexo,
apertei o botão de emergência –
mas a saída não apareceu.
E aí eu comecei a cometer loucuras,
no tempo da inconstância e na vala
comum de todas as quimeras, sitiado,
inadaptado, esconso, sou todo ouvidos:
aquilo que o século me sussurra eu tento
decifrar, mesmo que em meio à combustão dos anos a memória vague
poluída, renitente, enquanto teimo em preservar o espanto,
a maravilha e algumas letras
douradas nas lombadas.
(das Notas Marginais)

Spa Kkathivo

Lobotomia ninfática
Trepanação ur-védica
Bombardeologia de terapeutometria
Acupuntura com espadas sagradas arturianas
Banho macunaímico na macarronada fervente
Lipoaspiração na tampa da lata de leite moça
Necrofilia aromática
Esquizonomia com banho de baba de pantera
Copromancia hiper-ultra-super-zen
Poker charudízico em raio laser de luz preta

Véu de maia incluso
Oblívio
Felicidade
Sauna vulcânica

Tudo
Em 3 prestações

A tal gota de sangue, sabe?

Observo a respiração lenta dos felinos,
seus olhos fixos,
o arranhado fundo,
fino,
penetrante.
(Há sempre tanto sangue nas tatuagens recentes...)
Ah!
É tão leve
a violência dos amores.

2/12/2007

nº 13

Escarafunchando as unhas até que sangrem,
não sei que estranha intimidade a alma tem com o corpo.
Revisado o rol das emoções, nada
que se possa impunemente comunicar. Deve ser isso
a solidão.
Céus azuis, baladas, um tudo postergado, porres, boletins,
todas as cotações, os índices de Abril e este mar,
ah este mar enquadrado na janela
como uma mão de ferro aos desmandos do espírito.

Meus olhos nunca entenderam mesmo nada do mundo.

(das Notas Marginais)

2/11/2007

SÍMILE

SÍMILE


O capitalismo
nos substitui como porcos.

Allen, Gregory, William,
em breve habitarei um chiqueiro.

vou triste com as pulgas
coladas à face
os ombros arqueados,
as pupilas? – faróis baixos

o coração é um motor
apodrecendo ao sol
neve e néon cintilam
no meu sangue oblíquo.

Gisaburo estende
sua mão

folhas secas
caem outono
no poço onde me afundo.

eu
mais um endereço
na cidade.

2/08/2007

Caixa de ressonância (Versão 2)

Gruta voz de cristal
Líquido.

Sereias estéreo
De garras de rapina
Gritam as paredes.

E você ali
Na gruta –
Olhos fechados.

Mortos gozam de sombras.

Delfos Urbanus

se entro no ônibus
a roleta parece
decidir todo o destino
- não somente o teu

a urbe quando
percorre a orla
e erra por túneis
estreitos
o fundo
e já são oráculos
- não mais aves desavisadas
pneus que decifram
na frenagem.

2/06/2007

Espírito

os livros lidos
os livros não lidos

manchas amarelas
vento e pó

haroldo morto
elogio à térmita

hilda morta
e tu não te moves de ti

os olhos
coalhados de silêncio

porque tudo
é triste

2/05/2007

O Rei dos Mapas

O telefone preto
Pesadão
Que não traz pulsos como signos
Mas ogivas
Aparelho
Feito para soar o aviso
Final
No dia da bomba D, o mundo
Pelos ares
Passado repentino, pleno
Sumiço
De todo traço de memória:
Um punhado de sal
Cuspido pelo telefone preto
No dorso anfíbio da memória
Que não traz pulsos como signos
Mas ogivas,
Oração de pombas
Vomitando na varanda,
Detonaria a última senha.

Explosão que agora repousa
Na feira de antiquários
Próximo à taça de cristal

Azul

Dos anjos de bronze esverdeado
De granizo
E ao fundo
O deposto Rei dos Mapas
Em

vertigem


Leva e traz o mundo
Repartido em tubos
Na caixa de papelão.
De cada uma das linhas
No papel azul
Emana potência divina
Pulsa o rio
Que se reparte em
Rodovia
Que se reparte em posto policial que se
Reparte em cratera que
Se reparte
Em alma
Que morre quando se água
E desce
Lentamente
No ralo da geopolítica.

(Assim neste ritmo de
Valsa
O mundo se
Acaba a partir de hoje
No compasso em que
O Rei dos Mapas

Cheio

De si enrola a cartografia
Onde se escondia pontilhado
O Éden
No mapa que o velho vendeu por 36 reais).

2/04/2007

Haltura


todos os atos

sublimados


entre

glória & redenção


agonia

dentro


sem medo

de sentir medo

do medo

de ti.


2/03/2007

Um trecho*

Não sentia mais dor, agora. O travesti flutuava por sobre as luzes da cidade e sentia em seu nariz o ar molhado de sangue. Pensou em Paris, no avião, nela vestida em plumas. Nela de chapéu. Ela era Audrey Hephburn vestindo Dior, Marilyn Monroe cantando Diamonds are a girl´s best friends. Engoliu uma placa de sangue que voltou e escorreu pela boca. Estava sozinha, ali, no meio da rua, boiando em calor e vermelho. Não sentia as pernas. Sorriu, imaginando o palco e ela ouvia as palmas e os gritos e os assobios. Queria um abraço, agora. De qualquer um, de sua mãe, de seu pai, os desconhecidos que a puseram no mundo. Tentou se mover e tudo perdeu o foco. Fechou os olhos. Estava quebrada. Era um corpo inerte jogado no meio da rua fria. No meio da noite de São Paulo. Uma lágrima escorreu de seu olho. Seu queixo tremendo e ela pensou em canhões de luz e alguém gritando luzes, câmera, ação. Ela no centro da lente do cineasta europeu. Fellini, Pasolini, Hersog. Deus!, e a dor lancinante correu toda a sua coluna vertebral. Vomitou e engasgou com a gosma vermelha que entrou em seu nariz e o ar faltou e ela não conseguia parar de arregalar o olho e ouvir a sirene tocando e todo mundo correndo em volta dela, a velha de robe e bob na cabeça, o velho descabelado e com a barba por fazer, os meninos com cara de sono, o médico lindo vestido de branco, a enfermeira enfiando um negócio duro no seu nariz, alguém amarrando sua cabeça num troço gelado, ela sendo sacudida e colocada numa cama fria, o choro, o frio, o medo, a tremedeira, o som faltando, uma dor absurda, um frio, um frio, um frio, tão sozinha, um medo, cadê todo mundo, mãe, mãezinha, deus, meu anjo da guarda, aleluia, pai, um quase silêncio, uma paz, um cansaço, uma luz, um alívio. Acabou.


*este é um pequeno trecho de um livro que escrevi em 2003, acho. Tá aqui no PC, foi aprovado por uma editora, mas, sei lá, duvido de sua qualidade e não quis publicar. Quem quiser ler, é só pedir que eu mando.

Cenas de uma cidade qualquer 5

<>Badalados antenados sarados, tudo de bom bonitos bembrasileiros, todo mundo quer ter formadores de opinião, uma história de lavagem que é muito legal, bem definidos básicos colocados, a proposta é se diferenciar, só tando aqui pra ver os efeitos do equipamento, na entrada tem um túnel, só o que estraga é o calor, tem gente de olho no carro importado, a mulherada a bandidagem. Personas satisfartas satisfraturadas satisfaturadas, boquiabertas olhifechadas, devoradas desarvoradas, deglutidas defletidas, consumindo consumidas, desaparecidas no rumor dos dentes da máquina produtora de alegria – desesperada alegria. Máquina-sorveteria, máquina-spaZen, máquina-Cambuí. Satisfacção Azul. Comando da Qualidade de Vida.
Verde verde vômito como amarelo – amor amor solidão – o meio-termo é cela sétimo selo ainda ontem uma criança desenhava em traços grosseiros o que bem dia ser uma forca mas era uma chave duas chaves voando ao redor de um trem o que faz pensar no corpo no silêncio nos restos mortais no porque agora sim agora não agora sim agora não eu te amo meu bem sai do meu caminho peste se eu entrasse naquele trem que mais parecia um funerária ferroviária desenhada num caderno verde como vômito amarelo eu veria todas as faces pétalas podres num ramo seco? <>
(Há poesia na classe média?)
A questão é se o rancor também tem dedos como as palavras de amor – o rancor as palavras entrando como um cotonete na uretra como agulhas nas veias – tudo o que passamos juntos meu bem neste enclave fortificado os sonhos vizinhos dão náuseas fantasiados de sentidos embaralhados mas sabendo que cada coisa em seu lugar a luz acesa os copos sobre a mesa as palavras certeiras o a ser dito e a não ser dito – ai esta maldita coceira no ânus da pequena
burguesia quanta palavra antiga –
talvez a mesma letra morta escrita à margem das citações e se eu me tornasse um agente da expansão civilizadora? Se eu ensinasse as artimanhas do corte e costura da postura boa ou má tanto faz se eu me vestisse de lobo para entrar nos sonhos das matronas do bairro e dissesse por que você olhou minha gérbera de cima abaixo lentamente como uma grua, o vestido dela não combinava com tua querida sorveteria verde-amarela? E se eu te levasse no trem desenhado grosseiramente pelo menino ontem à noite (ele mal acabou de desenhar e já estava dormindo) acho que lá dentro depois da fina parede de papel entre o papel e a mesa dentro do trem deve existir outra chave um rabisco apenas que eu chamo de chave por comodidade mas outra coisa ainda coisa outra

não era bem isso que eu estava dizendo

será que a Matrona-Mor Ceifadora de Poddles continuaria roteirista de desastres aéreos discutindo exclusão social na hora da massagem enquanto o maridão nostalgiado com o Anauê na sauna verde vomitaria o próprio sangue?

Perguntas

porquê escrever?

de onde vem a crença na narrativa?

que loucura é esta que te faz escrever, te faz simplesmente acreditar que possa encadear palavras e querer formar sentido e da mesma maneira que me dá vontade de me entregar à leitura e ficar escutando os sons das palavras e me acalmando por estar neste cubiculo que é o mundo.
que loucura é essa que nos impele viver e viver de certa forma, uma
forma nova é possivel?
o que para mim é mais dificil é aceitar que a literatura não é algo
natural, que é construida e pensada e elaborada
e tanto pode acalmar como nos colocar ansiosos e sobressaltados pois
desfamiliarizar

desfamiliarizar, acho que este seria o conceito chave para você
destes contos, o que seria seu? qual o desejo que te impele a
escrever? podemos dizer que é o excesso - de desejo - que gera este
apetite mesmo magro da escrita, são como lento entalhe?
agora acabo já me sentindo mal por me intrometer tanto assim ns suas

questões, afinal, basta !

2/01/2007

haicão japonês


akita sol nascente
crescente em lealdade
onde a amizade é infinda

Resenha Quem Mexeu no meu Queijo


Quando dei aula numa Facu em Brasília fui obrigado a assistir, naquela detestável reunião de começo de ano, ao vídeo mais infame que já foi feito em todos os tempos. Baseado num livro de auto-ajuda empresarial, best-seller da gestão post-moderna. Demorou, mas resenhei o dito. O clima tolinho da resenha tem a ver com os comentários que os puxa-sacos (como gostam de ser vítimas, coitados, sofridos os professores...) fizeram após a sessão Laranja Mecânica.


Era uma vez


Os dois duendes doentes
Mais os dois ratos dementes.
Moravam num labirinto
Sempre à procura de queijo.
(E o pedaço de queijo
É o que você imaginar
Num gostoso manjar:
Um beijo? Beijo não!
Um bom carro do ano.
Desejo? Desejo não!
Mas uma bela mansão.)
Os ratos não paravam
Pra respirar e pensar
Pequenos self-made mouses
Queriam se estourar.
Dos dois duendes doentes
Um era mais que perfeito
Logo fisgou, e de jeito,
Todo o sentido da vida:
Uma constante corrida
À procura de queijo
A ventura da aventura.
Mas no outro deu defeito
O defeito de pensar
Só pra poder reclamar.
A coisa ainda piorou
Depois que ele encontrou
Uma novela de Kafka
Ardida como uma afta
Chamada A Construção.
Ali o duende aprendeu
Que labirinto é prisão
(Vejam os muros altos...)
Que queijo é insosso
E causa má digestão
E em sua nova demência
Inventou a ciência
De procurar a saída
Do labirinto maldito
Que se fingia de vida.
E em versão moderninha
Com mito e psicologia
Sacou a simbologia
Do labirinto e do queijo
Na repressão do desejo.
Seus três ex-colegas
Os self-made mouses
E o duende previdente
Na inflação dos egos
Sofriam, em sua ótica,
De compulsão psicótica.
Ainda estão no labirinto
Mas seu fim é tão triste,
Que sinto muito contar
Neste conto da gestão
“Pra vencer mentalize”
Que devia ter a lição
De moral, conclusiva:
Isto porque escondido
No grande monturo
De queijo mortal e fedido
Morava o voraz, cruel
E feroz minotauro.