Ter que lidar com a própria mediocridade –
talvez isso não fosse matéria de lirismo. Miséria emocional burguesa, essas
coisas. Vá pro cinema, passeie ou fique em casa, deposite sua dor em contas
alheias mediante ameaças de choros histéricos. Apague a luz, abra a janela,
acenda a luz, feche a janela, vá até a estante para verificar se o livro ainda
está lá, abra a mala, sinta o cheiro de papel velho, pergunte-se quando tudo
começou, quando você conheceu o Medo.
Derrame
o vinho nos degraus, autoconsumir-se não é inebriante. Veja o sangue na
calçada, brotando entre as raízes que rompem à força o concreto armado e se
debruce sobre as flores pálidas e estrelas apagadas atrás de monumentos, mas
não confunda sua solidão com qualquer evento natural ou cósmico. Procure algum
amparo mentiroso em qualquer místico anacrônico. Fique sabendo que quem ama e
exige atenção ao seu amor causa tanto mal quanto quem odeia. E então constate, certamente o Medo chegou
antes: antes da mala, da janela, da luz e da estante, antes da miséria
emocional burguesa e seu lirismo. Tome ar, respire fundo e mergulhe. Mergulhe.
E mergulhe.
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