11/03/2011

Quando soltas as palavras são como cães de caça

Quando soltas as palavras são como cães de caça:


sangue sangue sangue sangue plástico sangue carbonizado flor de laranjeira sólido cristal mancomunado com as forças ocultas do orgasmo natal porque tantos peixes nesse campo viscoso seminal saber se Jesus ejaculava a lua ri cheia de dentes na minha imaginação um ímã atraindo os cães do pesadelo notívago lustres flores capturas de repente me lembrei do padre Ivo

veia de arame farpado aranhas sobre a pele adormecida estátua sonora de vulto inconstante espaço aberto gelo ventania, confessar-se e dez ave marias

pétalas facadas um revólver na mão do abominável homem de neve Jesus cristo e os santos uma assembléia de cães gatos e sapos ornitorrincos no campo solto do sonho de onde vem a luz do sonho uma lanterna um leão agoniza uma sombra uma caverna um vulto sem nome uma enxada cortando a cabeça do herói medusa rasteja sob o orvalho o longo fio de cabelo do pássaro morto na memória é tão fácil lutar contra uma abstração onde esqueci a coleira o refúgio a nota de rodapé o produto interno bruto o Sr ministro advoga uma causa perdida entre os escombros

nevoeiro lama respiramos fumaça na cidade incendiada fogo pelos poros pela pele foi a vodka que matou a moça e agora pastor pinguço e sua palestra premiada e seu cartão de ingresso na Festa Absoluta e o rigor da vestimenta a capa vermelha a espada o escudo o míssil a bomba a tiracolo no lugar da pasta e seus papéis e todos os carimbos e os títulos de inspetor do esgoto abúlico do fruto proibido faminto de nozes mordidas pela casca dura dentes quebradiços como uma folha de parreira cobrindo o Ivo viu a vulva de Eva:


Você vai ver como a memória trabalha a seu favor.


2 comentários:

luiz gustavo disse...

...eis-me aqui
lavrador de mim mesmo
sobre a ossatura curva
e dura dis-
traído com as unhas
dessas desassossegadas rimas
como os nervosos fios da meada
que se estendem teia-à-teia
em formas de tentáculos
nas veias mais profundas e rasas
expulsando-me
os (a)braços longos
entre o turvo olhar
e o denso olhar
do pôr-de-sol
que finda a fábula
que inflama a noite jasmim
que sonhei a noite inteira
nesse transe pelos picos
onde as nuvens
alcançam o céu leitoso
do dia agudo
ousado oco
ou miragem morta atada
aos alicerces
desta alma ressequida
das idas sem fim sem começo
sem som imagem
e teço uma jornada de tudo jorr
ando palavras da lama
que brota em explosão contí
nua como lava nua
varrendo-me o roer dos ossos
acordados de qualquer ausência
ácida de sabor rosáceo
do fósforo exposto
à sombra e o langor
do polegar garra polida
sentida pela nuca da mais
pura fibra de dentes
úmidos do músgulo intenso
dos flancos imensos
silênciosonhos retidos
na névoa da retina
que atiça-me vê-la
abrupta rompendo
com os tornozelos
do poento crepúsculo
comum dardo insone costurado
às vigas dos meus cotovelos
curvos onde os corvos
crivam de cicadas a carcaça
encurvada da corvina
nas cravinas da caverna...


www.escarceunario.blogspot.com

www.setecetaras.blogspot.com

Daniel F disse...

Língua Epistolar



Quando você era um deus: gestos, atitudes, o modo de andar e de olhar, indicavam as coisas em sua presença. Você não falava, não era necessário, pois tinha o dom da imortalidade das bestas-feras. Vivia sob o espanto constante das tempestades em cavernas e achava que todas as coisas estavam cheias de deuses.

Quando você era um herói: gigante brotado como semente da terra, guardava para si (excluindo disso as bestas-feras animalizadas no arado com os olhos voltados para o chão) o segredo das similitudes. Falava de um escudo com desenhos de cidades, pessoas e animais, navios e guerreiros, rios, desertos e oceanos, quando queria descrever sua cidade repleta de pessoas, animais, navios e guerreiros.

Quando você é vulgar: apenas negocia convenções, não domina os segredos, qualquer um pode dizer que árvore é o nome de uma cidade, que cidade é o nome de uma arma, que arma é um sentimento, que sentimento é o nome de um faraó. A língua epistolar é a conversa vulgar no desentendimento, mesmo que este ocasione encontros repentinos e imprevistos. É quando uma criança autista diz pra você: se o mundo gira, porque você não fica tonto?