4/18/2012

desvio para o vermelho



(my red homeland - anish kapoor)





Alice não tem mais tempo Senta no chão
e chora Suas lentes estão gastas desde que o Outono
desfez-se como um pesar sobre a natureza Ela
não tem mais tempo e mesmo assim gostaria
de ouvir o rugido que vem das estrelas ou
do espaço entre elas ou não se sabe de que
nenhures vem este rumor que se confunde com a cidade
trincando suas engrenagens enquanto
as galáxias se afastam com ela no centro
sem endereço fixo vendo as estrelas indo embora
como efeitos locais de tanta espera e inventando
teorias pinçadas do se que observa nos escombros
de ser quem é Alice não tem mais tempo Ela
permanece olhando o passado em estilhaços
que são espelhos que fogem com as galáxias
pra dentro de si mesmos apagando pistas Ela
senta no chão e chora cada descoberta como
o acidente de estar no centro e só enquanto
as luzes se afastam antes que se pudesse definir
de onde vem a sua urgência Ela não tem mais tempo
e os pombos não podem mais voar Não podem mais
levar nenhuma carta

4 comentários:

Mar Becker disse...

Nossa, este poema me tocou muito, me emocionou. É de um lirismo sem igual, misturado a uma porção de imagens que se desfazem (a impressão da areia que escorre me acompanhou desde o primeiro verso)...
Os versos do meio se instauram de modo a criar uma espécie de esvaziamento: "[...] não se sabe de que / nenhures vem este rumor que se confunde com a cidade / trincando suas engrenagens enquanto [...]", até a parte em que diz "inventando teorias pinçadas do que se observa (erro de digitação ali?) nos escombros / de ser quem é".
E o final, dolorido: que bonito, que bonito, que bonito.

Sem mais, é lindo, me dá vontade de chorar.

Mar

Daniel F disse...

como eu gosto do movimento das poesias do Aldemar. é uma fala que quase não para pra respirar mas que não soa como uma fala sem interrupção, uma fala brutal. é um canto falado. e quando a coisa parece bem direta, literal, de repente vem uma imagem que te pega de surpresa.
quero escrever sobre a Mar e o Aldemar.

Daniel F disse...

Aliás, Aldemar, você já viu essa instação? está em inhotim. ela completa tem ainda mais a ver com o poema!

Aldemar Norek disse...

Legal, Mar. Legal, Daniel.
A ideia, acho que é mesmo de uma fala brutal, que se fala em suspenso, enquanto algo (O Algo) acontece e acaba se insinuando (esse Algo) no banal da fala. E se essa fala "afeta" de algum modo quem ela toca, então tá bom pra mim. É só isso o que eu quero mesmo. Ou quase.

Não,Daniel, ainda não fui a Inhotim. Coincidentemente (ou não, por motivos óbvios) ontem mesmo estava pensando em programar uma viagem pra lá em outubro ou novembro....

Escrever sobre a Mar e sobre mim? Fiquei curioso. Se rolar, me avisa. E o interessante é que já senti o mesmo impulso - o de escrever sobre vc e sobre Mar.

Abraço, Daniel
Bjo, Mar
vamo que vamo.