4/05/2014

Pra dizer adeus

entre os bichos de estimação, prefiro
hiena, pantera e leopardo.

o sol se põe no éter líquido
tragando consigo noite adentro
os tristes predadores 
e solitários.

o vazio do espaço é de natureza viscosa, lenta
e toda chama sem sombra se derrete num verde-morte
de astros negativos, ferruginosos:
ainda assim alimento as feras
que sabem respirar a nãoluz das cavernas.

e ao sol que se queima à noite como um grito
a este sol o coração conspirador está aberto: poeira
de estrelas imersas em tempestade
de areia em deserto arranhando a pele de constelações sensoriais
e o sangue de lento e breu desenha um planetário no peito
com muita fome por dentro, e subversão sabotando âncoras.

meu coração se expõe como a nervura de caninos muito afiados
sujos do sangue de pequenas luas e animais indefesos
porque acreditei que seria mais lúcido
com a pele toda queimada de fogo negro, do mar negro
noturno onde o sol se afoga toda noite.

e qualquer um enfia a mão por dentro do meu peito
mãos doídas de maçarico, do fogo verde da melancolia –
e no céu sem estrelas entrevejo um jovem sendo espancado até a morte
uma noiva viúva à espera do noivo sem unhas
um menino amarrado em árvore para o fuzilamento
e meu amor lacerado por desinfetantes
como se eu fosse uma doença fatal.

acreditei que assim seria mais lúcido,
mas toda pessoa diurna se enovela como um cofre
no porão de um navio náufrago em turbilhão anoitecido.

a pessoa diurna é onde um segredo morrerá para sempre
e se obscura e caverna com seus animais domesticados,

e é assim que meus bichos de rapina se voltam contra mim
como se eu os tivesse trazido em armadilha
e sou todo roído, dos pés à cabeça, por dentes noturnos
e o sol cai numa chuva ardente por dentro do que digo.

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