Você não vem novamente. Alegou
desta vez a chuva intermitente há
dias persistindo sobre os telha-
dos da sua cidade e da minha. Sou
refém de um animismo primitivo
e me queixo às coisas quando, em repouso,
penso dizerem verdades que ouço
e simulo crer, como no destino
ou na maior parcela das pessoas:
é uma solidão este tumulto
que me ladeia. Em vão,frente à arisca
face do amor, quero o abismo e todas
as vertigens desse filme inconcluso
onde estou só, sem luz, sem roteirista.
Quando você é vulgar: apenas negocia convenções, não domina os segredos, qualquer um pode dizer que árvore é o nome de uma cidade, que cidade é o nome de uma arma, que arma é um sentimento, que sentimento é o nome de um faraó. A língua epistolar é a conversa vulgar no desentendimento, mesmo que este ocasione encontros repentinos e imprevistos. É quando uma criança autista diz pra você: se o mundo gira, porque você não fica tonto?
6/29/2008
6/26/2008
70 personagens de um romance inacabado de Lima Barreto
O medíocre aponta o dedo pra lua,
pra melhor ver o próprio dedo.
Citação tirada da placa inaugural da rodoviária de Uberlândia.
Primeiro Movimento
É tudo sempre o mesmo
Marlon.
Eles vivem no mundo
Da lua e escrevem
Por encomenda, nos rigores do método
Taylorista enfiam a viola no saco e tomam
O café
Melado de açúcar.
Paus pra toda obra
Fazem de tudo
Pra “introjetar”
Que a corporation é uma corporação
De ofício: de fato
Se vê romantismo
Nesse lance de relatório
Artesanal.
(Mas num ônibus ninguém
Os distinguiria
De uma excursão de gerentes de bingo).
São fodidos
Pedindo emprego,
A missão da empresa é dizer que:
A cidade é boa, a terra
É fértil; ubérrima
Diria Policarpo Quaresma,
Um sonho tornado real.
Segundo Movimento
No coro dos infelizes
Você pensa que é
Especial porque usa um blog
Como escarradeira e não quer
Ser confundido
Com os gerentes de bingo:
“Minha camisa
Amarrotada
É minha bandeira” ou
A estátua tem
Uma cabeça grande
E brilhante
E um corpo de dar
Inveja
Aos cães amestrados
Com seus diplomas iluminados
Pelo luar do sertão
Mas as notas de rodapé
São de barro
(O sonho apocalíptico
De Daniel).
Terceiro Movimento
Uberland – Ubermensch,
É latim, é inglês
É alemão
É a finitude
Do homem ocidental
É a hermenêutica pós-moderna
É o festival de citações
A carta na manga e o bolso vazio
À sombra dos clones
De Roberto Justus.
É o lirismo
Do pesadelo acadêmico.
É a poesia
Sem charme
Dos concursos, escrita
Com os tipos dos carimbos[1]
Que não deveria ter sido
Escrita,
Não merece ser lida.
[1] Carimbo: etimologicamente, o ferro em brasa usado pra marcar os escravos que saíam de Luanda. Escravos como Aristóteles, mas sem o consolo da filosofia, fechada para o balanço. Falida.
pra melhor ver o próprio dedo.
Citação tirada da placa inaugural da rodoviária de Uberlândia.
Primeiro Movimento
É tudo sempre o mesmo
Marlon.
Eles vivem no mundo
Da lua e escrevem
Por encomenda, nos rigores do método
Taylorista enfiam a viola no saco e tomam
O café
Melado de açúcar.
Paus pra toda obra
Fazem de tudo
Pra “introjetar”
Que a corporation é uma corporação
De ofício: de fato
Se vê romantismo
Nesse lance de relatório
Artesanal.
(Mas num ônibus ninguém
Os distinguiria
De uma excursão de gerentes de bingo).
São fodidos
Pedindo emprego,
A missão da empresa é dizer que:
A cidade é boa, a terra
É fértil; ubérrima
Diria Policarpo Quaresma,
Um sonho tornado real.
Segundo Movimento
No coro dos infelizes
Você pensa que é
Especial porque usa um blog
Como escarradeira e não quer
Ser confundido
Com os gerentes de bingo:
“Minha camisa
Amarrotada
É minha bandeira” ou
A estátua tem
Uma cabeça grande
E brilhante
E um corpo de dar
Inveja
Aos cães amestrados
Com seus diplomas iluminados
Pelo luar do sertão
Mas as notas de rodapé
São de barro
(O sonho apocalíptico
De Daniel).
Terceiro Movimento
Uberland – Ubermensch,
É latim, é inglês
É alemão
É a finitude
Do homem ocidental
É a hermenêutica pós-moderna
É o festival de citações
A carta na manga e o bolso vazio
À sombra dos clones
De Roberto Justus.
É o lirismo
Do pesadelo acadêmico.
É a poesia
Sem charme
Dos concursos, escrita
Com os tipos dos carimbos[1]
Que não deveria ter sido
Escrita,
Não merece ser lida.
[1] Carimbo: etimologicamente, o ferro em brasa usado pra marcar os escravos que saíam de Luanda. Escravos como Aristóteles, mas sem o consolo da filosofia, fechada para o balanço. Falida.
6/18/2008
A medalha milagrosa
Na varanda do hotel
A moça vestida
De sibila
Desencantada fala em esquecimento
Como gotas sutis que
Caem de sua boca &
Apagam
Pouco a pouco
A paisagem, enquanto isso
Na suíte sacerdotal
Um peixe
Na garrafa de vinho
Cheia de sangue
Insiste
No direito de ser lembrado
Por laudos periciais
Para todo o sempre,
amém.
A moça vestida
De sibila
Desencantada fala em esquecimento
Como gotas sutis que
Caem de sua boca &
Apagam
Pouco a pouco
A paisagem, enquanto isso
Na suíte sacerdotal
Um peixe
Na garrafa de vinho
Cheia de sangue
Insiste
No direito de ser lembrado
Por laudos periciais
Para todo o sempre,
amém.
6/14/2008
outro relato, nem tão imparcial
Fala e sombra no deserto, onde tudo acontece. E o deserto ficou líquido de repente, afogando os peixes, que não sabiam morrer de improviso e cuspiam palavras que se colaram num céu de chumbo apenas superfície, impenetrável. Como não aprendi o que fazer com elas, acordei, e a mão negou-se a sair do sonho: ainda acariciava a areia e a água. O céu não, apenas pesava e era uma lembrança de que não se sai inteiro, não se sai inteiro do trânsito simultâneo de dois mundos.
6/13/2008
o tempo no tempo
disse uma
única
vez
ao amigo!
mas eu não tenho tempo!
e caminhou cansado
de volta pra casa
vendo aquele mesmo
mar que agora é
o outro
sem fim
sem mim
e depois disso
não mais disse
está mergulhado
em algo que não
ama
nem mesmo
sabe
o quê.
indefinível.
e volta pra.
e caminha.
única
vez
ao amigo!
mas eu não tenho tempo!
e caminhou cansado
de volta pra casa
vendo aquele mesmo
mar que agora é
o outro
sem fim
sem mim
e depois disso
não mais disse
está mergulhado
em algo que não
ama
nem mesmo
sabe
o quê.
indefinível.
e volta pra.
e caminha.
6/10/2008
Relato imparcial de um sonho
Ele, não me lembro de seu rosto ou outros sinais característicos, mergulhava no alto mar. Tudo leva a crer que era o mar quente da Bahia. Mas isso vinha mais da impressão causada pelo verde quase marrom, não era possível sentir a temperatura da água. Em seu jeito de olhar, ou na maneira como nadava, ou melhor, boiava, nada transmitia a sensação de desespero que por ali flutuava, meio ausente. Ausente, apesar de ele estar preso numa daquelas gaiolas que mergulhadores usam pra se verem livres
dos tubarões.
Ele estava lá na terceira pessoa. Vi tranqüilo, mas perplexo depois de acordado ao me lembrar de minha ausência neste sonho que, junto com o mergulhador normopata, dentro da gaiola, boiava um cadáver carcomido pela água salgada. O rosto do cadáver era marcante, tipo filme de terror B: dois buracos no lugar dos olhos, mas buracos que enxergavam, afinal de contas você sente quando está sendo observado; os dentes amarelos se destacavam na boca azulada.
6/03/2008
nº 18
Na impossibilidade de serem místicos
('ah, luzes da cidade,
por que, distraídas, não acendem meu destino?')
seus olhos colecionaram sexos que brilham à noite como flores planas e úmidas
de duas hastes.
O amparo do cético é o abismo, como se Deus
ejaculasse indiferente, em sua túnica violeta. Você, arlequim, só queria
despir o que é e se perder na fuzarca do mundo. Aqui
cada um escolhe o próprio veneno, mas não se sabe
que inseticida mata, definitivamente, os vermes
da paixão.
(das "Notas Marginais".)
('ah, luzes da cidade,
por que, distraídas, não acendem meu destino?')
seus olhos colecionaram sexos que brilham à noite como flores planas e úmidas
de duas hastes.
O amparo do cético é o abismo, como se Deus
ejaculasse indiferente, em sua túnica violeta. Você, arlequim, só queria
despir o que é e se perder na fuzarca do mundo. Aqui
cada um escolhe o próprio veneno, mas não se sabe
que inseticida mata, definitivamente, os vermes
da paixão.
(das "Notas Marginais".)
6/01/2008
Direto de Goiânia
Hospedado no inferninho
O sujeito reage bem
Ao cheiro de pequi
Impregnado nos lençóis
Lendo O Samurai Corporativo,
Vulgo
Pecuarista do ying yang.
"O mundo é rico
de inimigos".
No café da manhã
Sun Tzu apontou
O dedo indicador
Pra testa do discípulo
Usando o polegar
Como gatilho
Depois disse à recepcionista
"O seu chocolate
Está no frigobar"
& Sun Tzu disse:
"A buceta é a crise do liberalismo"
O sujeito reage bem
Ao cheiro de pequi
Impregnado nos lençóis
Lendo O Samurai Corporativo,
Vulgo
Pecuarista do ying yang.
"O mundo é rico
de inimigos".
No café da manhã
Sun Tzu apontou
O dedo indicador
Pra testa do discípulo
Usando o polegar
Como gatilho
Depois disse à recepcionista
"O seu chocolate
Está no frigobar"
& Sun Tzu disse:
"A buceta é a crise do liberalismo"
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