12/23/2011

Retificação

Ao contrário do que foi dito no Faustão domingo passado, Oito-Olhos não se restringe a aparelhos visuais (lupas, telescópios, microscópios, miras noturnas, lentes de contato, óculos, lunetas, colírios, astigmatismo e miopia, visão de raio x). É preciso entender a arte da penetração vocal das mentes para se poder começar a falar em Oito-Olhos. Gritos grudados na parede quente. Getúlio Vargas fantasmagoricamente em todas as salas na Hora do Brasil. Cid Moreira lendo a Bíblia. Pedro Bial lendo um poema apócrifo da Clarice Lispector. Vozeirões. Ainda mais que ouvido não tem pálpebra. Mas também vozes menores, feitas sob medida: vozes de parentes que te sacanearam ressoando pelas ruas, gritos esganiçados de cachorrinhos no apartamento vizinho, até a sua própria voz gravada e você dizendo que nem um otário: essa voz não é minha. Vozes que se dissolvem em ruídos e ruídos que se transmudam em músicas: o fundo musical de tudo, barracas de praia, shopping Center, espera ao telefone da central de atendimento (para quem não sabe, o inferno tem fundo musical). Além disso, quem ainda não percebeu que as palavras são microorganismos que fagocitam as almas dos despreparados, também ainda não sacou o alcance de Oito-Olhos. Ainda mais agora com a internet: estupro mental, trollagem de filhadaputinhas caluniadores, caixa de ressonância que faz qualquer fraco gritar como se fosse Hércules lutando contra os porcos selvagens endemoniados. E tudo isso em silêncio, explorando a maravilhosa invenção do deus Thot, como se pode ler na Wikipédia. Tua alma cheia de buraquinhos, pequenas mordidas, palavras cheias de dentinhos afiados. Também há o recurso da Alta Literatura. O Escritor que come lixo e o recicla ao contrário, soltando seus excrementos direto no receptor, já disseram que a mente é um papel em branco e o sujeito se torna um inteiro esgoto ao deslavar insultos sobre seus próprios delírios de grandeza, enfim: Oito-Olhos é multimídia e se Deus criou o mundo, Oito-Olhos é o editor. E sim, você pode dizer que não conhece Oito-Olhos, mas como diria Raulzito: Oito-Olhos conhece você. O que estou dizendo? Você mesmo é Oito-Olhos: não o dia inteiro, não em qualquer lugar, mas Oito-Olhos é parte de você e você sabe muito bem – conhece o milagre sem saber o nome do santo. Ser Oito-Olhos é uma coisa parecida com ter cheirado cocaína, bebido vodka ou ter atuado como pastor exorcista num rito da Igreja Universal.

Ps: Diante de tudo isso, fica a pergunta: como não enlouquecer? Algumas regras básicas: vomitar ao invés de cagar todo o lixo digerido. Fazer ao redor de si uma barreira sonora que não impede as vozes (não, não se trata de vidro anti-ruído), mas que as sintetiza numa música toda sua, uma oração que seja. Saber que Oito-Olhos não tem ego e muito menos confundir O Príncipe Míchkin com Dostoievski ou a cadela Baleia com Graciliano Ramos e Herman Melville. Saber que Oito-Olhos é real. Tão real quanto essa pessoa que aqui e agora escreve.

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