Furiosamente lento
O sol nasce
Onde seria o crepúsculo
Quando você é vulgar: apenas negocia convenções, não domina os segredos, qualquer um pode dizer que árvore é o nome de uma cidade, que cidade é o nome de uma arma, que arma é um sentimento, que sentimento é o nome de um faraó. A língua epistolar é a conversa vulgar no desentendimento, mesmo que este ocasione encontros repentinos e imprevistos. É quando uma criança autista diz pra você: se o mundo gira, porque você não fica tonto?
8/30/2013
8/25/2013
Onça anda em círculos
            na jaula abafada do zoo
e
parece neurose:
            (movimento interrompido
            torna patético
            mesmo o animal mais lindo)
            *
            Quando o tempo se
enovela
            Dando voltas e voltas em si mesmo
            Isso deve ser visto com a atenção de
um eclipse –
            Mundos são criados
            Espirais giram palavras até
sedimentar
            Uma dor, um satélite, uma forma de
vida:
            A onça anda em círculos
            Por dentro da jaula –
            Seus rastros desenham
            Uma rosa
            Uma galáxia
            Uma pulsação silenciada. 
8/20/2013
Espero tornar-me um louco muito mau
Os
influxos de um planeta todo verde
            por dentro, no sangue.
            O sangue circula do coração
            aos olhos e alimenta os movimentos
            das mãos que escrevem
            circulando em torno das palavras
            à espera de que, enfim, 
            não sejam mais necessárias como placebo
            para filhos de um planeta muito leve,
            muito lento, todo verde e vazio
            por dentro.
            Tento contornar a solidão
            com uma rede de palavras
            mas caio atravessando-as e quando me dou conta
            dou de cara com o sempre mesmo chão
            paradoxalmente duro e inexistente
            um chão cortante de esmeraldas pontiagudas
sem
solidez.
(De
vez em quando a vida manda notícias
com uma
lâmina verde na jugular 
            escrevo para não ver
            o que existe e é real:
            Nada. 
            *
            Caem gota a gota
            no meu sangue
            quase estrelas muito silenciosas
            e muito mórbidas
            elas corroem a língua, vampiras
            brincam de carrapatos na garganta
            ou sanguessugas crescendo por dentro
            do cérebro:
            e meu corpo explode como um grotesco
            pacote de fogos de artifício –
            e meu corpo não interessa nessa comédia
            a não ser enquanto máquina de expelir letras.
            Depois elas tomam o primeiro arame farpado
            como andaime
            e sobem aos céus, aos planetas
            e todos os outros rudes maquinismos
            obras de um deus de mau humor
            que elas vão alimentar de amor
            com o sangue anêmico que me foi roubado
            e elas flutuam, como pedaços de carne
            penduradas em ganchos
num
açougue celestial:
            - é a primavera que está chegando?
            e elas me deixam falando sozinho. 
8/17/2013
Todos um dia vão cair
Ismália vai à lua –
                cai no
muro.
                Puta
vestida de onça
                sentada
em desolação 
                de
gasolina me pede um cigarro
                - não
fumo.
                Um
caminhão atravessa
                o céu
de cachaça envelhecida
                no
carvalho:
                hagiografia
de coveiros
                e
cracudas fazem amor no cemitério:
                - Entre
o pernil e a vida
                o morto
ficou com o pernil.
Temos ainda a procissão
                o andor
é estudante e nossa senhora
 jovem envolta em lençol com sêmen.
                Protege-se
no sarcasmo o pensamento dividido
                a
oração de um cético
                na
igreja só para abrir trilhas no facão.
                É tudo
assim
                tão irrisório
iridescente
como a ilusão de um desejo
alheio:
                A
língua furiosa do amor e do desamor
                embriaga
os mitos.
Eu, vampiro, alimenta-se
                do pó
dos muros.
Ismália vai à lua –
cai no rio
                fermentando
de vida.
8/10/2013
Da série: Planetário de bolso
            Netuno
Uma fome nasce no mundo. Uma fome a mais. Procuram
domá-la impondo-lhe um nome. João (amava) Teresa (que amava) Raimundo. Netuno.
Ali onde havia uma equação. Onde cairia a maçã, se não houvesse um campo de
forças à procura da maquinaria do universo, abstraindo-a. Sangue verde,
formando uma pedra de gelo onde haveria a matriz de um coração. Despertar para
o sonho é como inspirar antes de um mergulho: com os olhos ainda molhados, a
luz azulada do dia. Para sempre ser intempestivo. Soprar verbos no horizonte
demiurgo. Aqui começa a revolta: ventania contra as grades de um nome. Inútil
procurar uma ordem entre essas frases. Um tridente, como toda invenção, antes
foi objeto de sonho. 
Júpiter
        Corpo lento em
pesadelo, imenso e leve se move no espaço girando velozmente ao redor de si
mesmo. A mania persecutória do escritor sabe que seus amigos não acreditam na
sua escrita, que os outros poetas não acreditam na amizade ou se acreditam na
escrita é por piedade amiga e que portanto como bons amigos não acreditam na
sua escrita e que ele, apesar de todo ceticismo e auto-sabotagem, vai
prosseguir escrevendo sem acreditar em nada, nem nos amigos e nem nos poetas e
muito menos na própria escrita. O estranho paradoxo de um demônio inseguro.
Giro ao redor de mim mesmo e me movo frontalmente, não saio do encalço de
alguma coisa parecida com uma tempestade vermelha que dá o tom dos meus sonhos
em que fujo de outra coisa ou tento capturar a vida, que sempre está à frente,
afrontando-me adiantada em estado de miragem perpétua. O que se vê de mim são
as garras tentando capturar o vazio, a fraqueza do soberano que se retira e
parte para o exílio no oceano noturno.   
8/08/2013
            O excesso de luz, imensurável – se luz é a
medida das coisas;
            Imagine uma régua que se encolhesse
– dilatasse – vertiginosamente;
            Terra, por dentro, incandescente –
por fora, desolação lunar;
            Como se o sol expelisse uma semente
– uma espiral de seiva;
            Todo um clima a ser observado – sem
atmosfera, por olhos inorgânicos. 
8/05/2013
Noites Brancas
1.     
 
O
fim continua após o corte
no
se consumir paradoxal da energia que se alimenta
depois
da última cena
(Um
girassol plantado na lua
na
lapela do homem que se retira sozinho
dentro
da cena ou fora, na sala de cinema):
                        2.
A
neve segue seu serviço 
de
compor um cenário para a sensação
interminável
quando a luz se acende 
e
o filme enquadra o sonho
ou
a vida, trancada em aquário de luz
para
consumo e alívio do tédio –
                        3.
Dia
e noite se misturam
                        no homem e no personagem
modulando-se
por tempos a fio
quando
sai do cinema para entrar na cidade
real,
no choque da realidade:
Variações
do mesmo, apenas
e
as pétalas estão mortas
vivas,
pulsando, roubando-lhe ar,
são
dentes muito finos sugando o coração, 
estão
mortas, vivas, cantam, 
ondulam-se
espumas de um mar amável, 
são
asas, bilhetes, alimentam, consomem, 
dão
coragem e medo da vida: tudo isso
Um
girassol plantado na lua
na
lapela de um homem que se vê
no
cinema
                        na brancura da noite, em
meio à vida social  
                        e sente um calor
impreciso
                        fugindo da lapela inexistente.
.
                        4.
                        Quando o filme acaba
                        e você tem que voltar
para casa
                        e depois do desfecho
                        o fim prossegue por
horas, dias
                        toda uma vida cultivando
o interminável
girassol
lunar – e a flor está enraizada
no
coração
e
seu coração, portanto, é de pedra
da
lua, com sua parte iluminada, diurna
e
uma noite que não termina.
E
você segue seu caminho
                        sem destino
                        com um girassol colido numa
ponte
                        toda branca
cravada
na lembrança.
5.
E
o desejo podado de dormir por 6 meses
acordar
sem esse girassol na lapela
-
mas ele é tão esdrúxulo
quantos
não gostariam de ter 
um
girassol lunar na lapela?
-
este girassol lunar
me
faz leproso, inimigo da ordem pública
quero
ser sensato, saber medir a ficção
entrar
e sair do cinema
como
um cidadão qualquer.
-
mas o girassol está enraizado
em
seu coração, como arrancá-lo?
-
este girassol lunar
me
impede de dizer bom dia, boa noite
como
vai, como está, tudo bem,
quais
são as novidades, que tempo seco,
frio,
que dia quente, você viu que choveu,
o
que você vai fazer hoje,
dá uma olhada na fotografia,
mande
notícias, depois a gente se fala
tudo
o que todos podem dizer
mas
não eu
quanto
tempo, por onde andou,
vamos
ao cinema,
você
já viu o filme chamado noites brancas?
-
este girassol lunar
que
brota da lapela inexistente
enraizado
em seu coração
sugando
seu sangue até a expressão da brancura
é
uma antena voltada para as mais imperceptíveis
forças
cósmicas
sem
ele como você falaria com flores e planetas? 
8/04/2013
So it goes
E
se ao invés de comer pedras
            lunares
            poeira fria e cinza
            você se alimentasse 
            de cometas?
            Cometeriam corações – rastros incendiários
            na espinha dorsal da vida
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