4/26/2007

Cenas de uma cidade qualquer (Presidiário)

Catava pedaços de madeira na rua, no que sobrou do cerrado. Aqui o céu nunca é o mesmo. Talhava no apartamento sem luz elétrica flechas, curvas e cabeças. Inventava nomes para os novos objetos (inéditos para mãos humanas e para a voz divina):

Calibina por exemplo, ou Dettera por outro lado.

Em seus planos (pequenos mercadores riam no canto da boca) compraria um carro, arrumaria o carro passaria para frente, compraria outro carro arrumaria o outro carro passaria para frente, e assim por diante até conseguir um super-carro que venderia e pagaria a conta de luz (ou então um trailer de cachorro quente, dois, três, quatro, cinco na maionese economizada. Depois venderia tudo e investiria no ateliê, nos bonecos de madeira). Idem com a kitchnet que alugava e assim por diante: tudo planos, perspectivas, tudo o que falta aos mercadores de fato.

Enquanto isso (quer dizer, enquanto seus planos de capitalização goravam) derrubava a parede do apartamento, refazia a parede até a metade, arrancava o piso, pintava o chão, procurava madeira na rua e esculpia. A madeira tem um jeito diferente de guardar o calor do corpo, como um apartamento sem luz elétrica.

Ganharam na rua portando maconha (o indivíduo) carregava uma trouxinha além da conta. Tudo seria diferente se praticasse esporte, se entendesse de informática não seria este parasita social. Seu delegado tem pena da mãe e do pai depois de ter obrigado o escultor a cantar o Hino Nacional no camburão, a família até que é boa gente, o advogado precisa de um palco por isso repete a palavra culpado, o juiz sentencia com a máquina de costura.

Inquirido no tribunal se era consumo, não (ia dividir com amigos):


Três anos de luz elétrica e a palavra Utilidade na Cadeia.

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