4/22/2007

Como um revolucionário vencido (no prazo de validade) ou: Não tenho minha Dicção

“Tempo é criança que chora
quando quebram a regra do jogo
e logo depois se esquece.”
Heráclito de Éfeso

Tempo é jogo, ritmo
de flores indo e vindo
vozes na varanda
latas de cerveja sobre a mesa

(tempo é outro dia
outras latas
vazias entre as flores frias
e o cachorro, de salvo-conduto
vinha

vinha e caía –

tristes flores de Campinas).

Ou então, noutro lugar
os últimos bêbados
limpam mesas e cadeiras
com os garçons, cansados –
poesia social, merda de salário
solidariedade de bêbado
revolução de boteco

também sou verde por dentro.

(Bar fechado, mesa vazia, varanda -
Ninguém.) Agora

segundo o manual de instruções
acenda uma espiral
no círculo riscado em cinza
sobre a prateleira de alumínio branco
e florescerá a garrafa de vinho
com a gérbera amarela
à frente de um livro

Fragmentos do discurso amoroso neste momento de onde ela está, a cidade mais próxima a 18 horas de barco. Incomunicável. E putz naquele dia ela acendeu o cigarro debaixo do Ipê Amarelo, vocês não vão entender.)

Ou quem sabe ainda
sob o sol inclemente
à procura de cola de sapateiro
ou carona o que pintasse primeiro
tudo pra vencer o dia
vomitando versos
sobre as putas de Brasília
no sopão de 24 horas
ou talvez na praia suja
dois bêbados juram
que o saxofone do é o tchan
é o calabouço da cultura brasileira.

E hoje na varanda (dessa vez no décimo primeiro andar) você olha a Matrona de óculos escuros que olha o mendigo que olha a bolsa e uma citação a mais e o abismo olha dentro de você e hoje na varanda você debate com OitoOlhos s.a., o cara é pós-moderno e não sabe, na hora de rezar escolha o Salmo 32 não faça como o cavalo e o jumento que não conhecem freio e rédeas o texto saiu truncado (será boicote?), por uma nova etiologia (o texto saiu, truncado será boicote?): narcisismo sem ego.

Mas não, o calabouço
era apenas a sala de espera e
as vozes, as latas, os livros e as flores
sumiram de vista.
Você anda pela casa
como um caçador à procura de rastros e

o tempo diz: o rastro é você &
você nem tem dicção própria
pra reclamar.

4 comentários:

Eliana Pougy disse...

Menino. Lindo isso. (é tão bom a gente se ver ao vivo e a cores, né?)

Aldemar Norek disse...

Cara, não sei em que medida algumas obsevações daqui mesmo do blog interferiram na concepção deste poema, mas acho que é bastante.

Gostei muito mesmo. Senti uma tateada no clima da dicção. Me pareceram experiências com a voz, a voz q fala.

Será isso mesmo? ou viajei?
abração!

Aldemar Norek disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Daniel F disse...

Pois é, também gostei muito desse poema. E é claro que sempre é melhor se conhecer pessoalmente Eliana, uma pena que não pude ir ao dulcineia sabe aquele papo das perguntas? dessa vez to tendo que estudar o dobro... E claro que tem tudo a ver com as conversas daqui, Aldemar. Não sei medir isso também, mas tenho prestado mais atenção na fala do poema. Esse aí demorou muito pra ficar pronto, foi difícil achar o jeito certo de dizer.