9/30/2007

Mapeando os circos. Circular do Ministério da Cultura.

Porque precisamos subvencionar e por isso fiscalizar, administrar – auferir, tudo com o firme propósito de incentivar a disseminação das mais autênticas raízes brasileiras por todo o solo nacional, fazendo dele um emaranhado multicolorido de brasilidade sempre vista, ouvida, sentida: Cidadania. Mas não somos apenas Getúlio Vargas, somamos hinos pós-tropicalistas, recorremos ao planejamento estratégico, à gestão ética voltada para pessoas vencedoras de óculos de aros grossos e pequenas lentes e por fim preferimos quase sempre os verbos no gerúndio. Decidimos que precisamos saber aonde vai o dinheiro. Precisamos de mapas. Mapas. Mapas. Mapas. E roteiros.

Pra ser circo tem que seguir o seguinte script:

Atrações tradicionais mínimas: mágico, palhaço e malabarista.

O mágico é aquele que usa truques para ludibriar o público em suspensão de descrença – se não forem constatados truques, a magia recai no âmbito da feitiçaria: o circo passando a ser arena de demônios.

O palhaço deve usar maquiagem, necessariamente: o riso da platéia não é de modo algum suficiente (isso é preciso ficar muito claro para nossos agentes): quem faz rir sem maquiagem não é de modo algum palhaço.

O malabarista é mais fácil de ser identificado, desde que se saiba que uma possível queda não o desqualifica como tal, que o malabarista é quem tenta executar saltos de alto grau de dificuldade – não qualquer salto, note-se bem, propomos uma medida de pelo menos 2 metros de distância do chão.

Não devem ser aceitas figuras ambíguas, como mágico-palhaços ou palhaço-malabaristas, para fins de mapeamento dos circos brasílicos. No limite deste caso, corremos o risco de jogar toda nossa pró-atividade num circo com um só artista, o que seria um acinte à opinião pública. Assim, um circo, para ser circo de direito (ninguém está proibido de dizer que trabalha num circo, mas o Ministério não endossa devaneios sem metodologia), deve ter pelo menos três especialistas em cada uma das artes básicas mínimas tradicionais do autêntico circense nacional brasileiro.

O circo não pode, em hipótese alguma, ser ao ar livre. Deve ter uma tenda, com no mínimo duas cores (excluindo-se o preto, o cinza e o branco). Ao ar livre não é circo, é bando de rufiões, trapaceiros improvisados, arruaceiros, sendo caso de polícia e não de Ministério. Se for uma tenda branca será workshop, preta não terá o quantum mínimo de alegria necessária para o definitivo reconhecimento de um circo como tal.

Os circos precisam, por fim, adotar as diretrizes do planejamento estratégico, apresentando ROTEIROS e MAPAS para suas viagens. Como os circos não têm endereço fixo, o planejamento é necessário para que eles não SUMAM DO MAPA (aliás, um circo que permaneça mais de um Mês no mesmo local será considerado BOTECO ou BORDEL, caindo visivelmente no conceito social). Mas não se deve confundir vida circense com nomadismo (característica, aliás, incompatível com a cultura nacional, tão apegada aos valores do lar).

O Ministério não deve financiar artistas de um dia, ex-prostitutas, fantasmas, vultos sem sombra ou magos. E, sobretudo, os circos podem até tocar Roberto Carlos para atrair as multidões, mas jamais, em caso algum, rock’n roll cantado em outra língua que não a luso-brasileira.

Um comentário:

Aldemar Norek disse...

Esta lei explica porque o governo se autofinancia (com a grana da gente, e sem oferecer garantia de retorno no investimento),não?
abração