8/30/2007

O plano B falhou, meu bem.



Todas as promoções deste supermercado escondem
armadilhas, ainda que os olhos
da mulher atrás do guichê de crediário
amplifiquem metáforas de sucesso:"como fazer amigos
e influenciar
pessoas
”. Seus olhos são verdes da cor do mistério, mas isto
não induz qualquer salto
para além da superfície. As coisas, a coleção
de coisas em oferta forma,
em estrépito cortante, o aparato de planos
onde é dado movimentar-se, meu bem, mas nunca
em plano-seqüência: alguém
grita “corta!” e você fecha os olhos, sonhando
com a próxima emulação de paraíso. (Deviam ter disponibilizado
nas gôndolas uma metafísica
de pássaros, qualquer uma,
para aquele que chegou
do campo agora e cuja memória
ainda vasculha sons
de primavera).
Caso você tente alcançar
o subterrâneo, o expediente se encerra e o mundo
fica parecido com uma calçada em frente às vitrines
depois das 22.

Adicionalmente, é bom saber que trocas
serão feitas apenas
às segundas e mediante
cupom fiscal, sempre das 9
às 11.

Com o seu aparecimento todo o céu ficou cinzento e São Pedro zangado

Dia nublado.

Você pensa que
A névoa é cinza
Mas outra camada
Do pensamento
Pressente a fumaça
Com pétalas e corpos
De animais carbonizados
Dançando no ar, em espirais
Caindo nos pratos
Nos copos de cerveja

Nas mesas dos funcionários.

*

As cinzas caem
Na mesa em que
Um sujeito reclama
Que o seu avatar
No second life
Ganhou vida própria
E gerou dívidas
No cartão de crédito:
Então é como se Deus
Estivesse fumando
E a cidade fosse o cinzeiro
Ou como se o Anjo
Caído vomitasse
Depois de ter passado
Toda a eternidade
Mastigando bitucas de cigarro.

*

A névoa cai na mesa
Em que o sujeito
Metido a professor
Com olheiras cinzas
Acredita que avatar
Remete a buda,
A cristo, ao nome
Que caiu sobre sua cabeça
Como restos de um paraíso
Incinerado,
Espalhados pelo vento.

*

Aqui o sol se põe
De um jeito especial.

8/27/2007

nº 44




Você não vai sair bem disto, o vício
de permanecer vivo. Fadado
a ser errante (despedacei com ela os melhores anos), a superfície
do planeta (sempre
me esforcei por adentrar a alma das coisas
) se obstina em manter o registro,
nas suas cartas (só queria imprimir na escrita os choques
do corpo, a explosão do corpo, até que alguma coisa
estremecesse
), de expectativas que se encerram
como ontem, quando bastava
olhar os beirais e suspeitar uma outra
ordem sob a tintura de tudo, sob o verniz
de máscaras. Agora,
o que era busca
de sentido virou-se em desespero de nunca
achar, na percepção
de que toda ação se passa vertiginosa
fora do campo, em laterais
que o olho nunca
alcança.
(das "Notas Marginais")

Sobre os nomes

Deixar minha sombra
neste amarelo

(Já nem sei se falo
de giovana ou gérbera)

:Pétalas se dissolvem
no colchão, um jardim
de movimentos lentos:

giovana.

:Sobre a mesa
repousa a memória
- Em que outro tecido
revi estas cores?:

gérbera.

deitar minha sombra
neste amarelo

(Já nem sei se falo
De gérbera ou giovana)

8/21/2007

Saudade da Giovana (Ou, lirismo mesmo, e daí?)

Se em sete sementes
Eu repartisse seu nome
E plantasse uma a uma
Em cada um
Dos sete dias da semana
Sete gérberas brotariam,
Entre junho e janeiro.

Cobrindo sete meses
Pétala a pétala,
Sol a sol,
Lua a lua:

Eu me esqueceria sete vezes
Do meu nome
E me chamaria asa, flor,
Flecha, manhã, tâmara, verde,

Domingo.

* * * *

Ontem sonhei ser
Um quarto escuro
Hermeticamente fechado
Onde você, meu amor,
Sonhava com seus brincos
Em forma de lua.


8/19/2007

Só mais um clique

Poesia: Só mais um clique (Eliana Pougy)

Clipes: O Piano (Jane Campion)

Give it away (Red Hot CHlli Pepper)



no entanto, ser
amanhã não mais
nem vagas
de espuma feito sal horas vãs
súplicas negros
ais:
marcas (ins)criptas no teu ser (quão ermo)
o olhar desaba sem alarde
e sai, de fininho:
fragas ante fragatas no ar onde naufraga o mar
gelado sob a pele
corrente
ou silencia em zona escura um coração tão branco
a pele água da pele viva
onde a palma plana
aquece plana se insinua:
ser - um vôo provisório
(2005)


8/17/2007

O Cérebro de Keyserling

Havia um cérebro guardado em conserva ao lado de intestinos de animais

Exóticos.

Este cérebro continha os segredos do suicídio em túnica branca para a alma dos tiranos e sabia falar metalicamente, encadeando uma palavra na outra, num tão agudo que perfuraria o ouvido das massas, aderindo-as ao programa da pacificação universal

Se elas soubessem ouvir por vias indiretas, quando dizia

Há uma serpente nos olhos do amante e da prostituta e eu estou aqui pra desfazer os nós através

Da metodologia dos mestres do chá e inventei uma cruz de cristal líquido para o seu pânico indolor, no bojo da questão.

8/12/2007

Sampa

acordo no meio da rua,
qualquer uma
das dez mil milhões de sujas
ruas paulistanas

um homem de terno azul
marinho e óculos escuros
e insígnia dourada na lapela
me olha fixamente

ele quer saber meu nome
e me segue por todas as quebradas
da cidade esquadrinhada.

ele quer saber de onde venho
e tem no bolso uma chave prateada
e no pulso um relógio cravejado de dentes.

ele espalha a própria voz pelas vielas
e pelos lustres de cristal do velho palácio
sussurra falando cuspindo via rádio
recitando poemas marioandradianos.

- nesta cidade imensa e nenhum sobrenome?
ele inquere.

eu desenho seu rosto
na calçada onde escorre mijo
em frente à banca de óculos de sol
- são mais de trinta óculos olhando
angulosos traços na calçada,
ao som de balidos da última balada
de elton john .

8/09/2007

O iconoclasta de Taubaté (filho da famosa velhinha)

Vivo intensamente a vida experimental. Ontem mesmo joguei mostarda no meu frango a passarinho.

O problema, mora, mora na moral. Tipo assim, mas que papo mais sei lá, eu hein, heil, véi: é o meu mestre Jack de Figueiredo discursando sobre os “homens sem marca”.

Tenho a vergonha bem cerzida na cara. Eu disse a vergonha, não as vergonhas. Porque aí seria uma coisa meio Pero Vaz de Caminha com Hyeronimus Bosch (tipo assim: boca de buceta, nariz de rola; ou tipo assim coriza de buceta, cu lacrimejante, cago pelos olhos, peido pelo nariz e tenho corrimento na língua; ou tipo assim kafkianamente não tenho porra de barata; não ia ficar legal).

Se vocês vissem minha agenda telefônica, iam babar de inveja... Estou a apenas 5 pessoas de distância de Osama Bin Laden. Tenho um chegado que trabalha no Itamaraty e foi com o Lula visitar o companheiro. Esse meu chegado conheceu um assessor do Bush. O Bush (se é que já não conhece pessoalmente o Osama) conhece algum magnata do petróleo, que por sua vez conhece O Cara.

Cansei!

Eu sei

Conto: Eu sei (Eliana Pougy)
Música: Inertia Creeps (Massive Attack)
Clipes: Asas do Desejo (Wim Wenders) e Dança do Ventre (Rachel Brice)

8/07/2007

O Real

somente o frio
é real

estou colocando
as meias
para o futuro

os sapatos
às bocas
do véu negro
do céu

minha cabeça
lenta
chapada ou anestesiada

não vive
para contar
a história

os sapos morreram
nos entulhos
dos fundos
da casa

desconheço minha casa
muitos livros
nos sebos

alguns na estante

raros no coração

a mente estraçalhada

minha heroína
não vem.

nunca veio,
não sei.

8/04/2007

Maré

No canto dos lábios, entre os dedos,
branco
e espesso,
é meuteu esperma:


onda que seca,
enfim,

na areia.

Qualquer vida cabe em poucas frases

1. Seja bem-vindo
ao Triângulo do Sol.


2. Todo homem de bem
deve ter
ao menos um
revólver (proteger-se
contra suas propriedades &
avançar
contra seu renome).

3. “Alegria desesperada”
no fim do corredor, daí
vomite no mictório

(e se eles não sabem
o que sentem?
)
se ninguém disser os nomes
ainda assim o nariz
distinguiria
(no Hades), covarde.

4. A vaga
é do Marlon
(ex
oesqueleto, exponha-
se ou tenha um ataque
de nervos).

5. Fourier
Prometeu melhor:
um ataque de neros.

6. O mistério é fácil,
enigmas não passam
de engenhosidades
post-barrocas
Gessy-lever
ou se revolver em
arcanos de horoscopia,

vida privada
de sentido:

a potência está contida
na palavra Não.