10/02/2008

N. 87




A cidade é de carne
Seu sangue é lodo, tubulações
Subterrâneas onde circula
O rio canalizado
(Assassinado), o rio onde nada
Meu avô, que morreu delirando
Com pescarias.

A cidade é a terra
Das minhas pernas
Crivadas de raízes e pequenas plantas
Que arranco, pacientemente.

Se tento fugir
Da cidade é em mim
Que encontro refúgio, e se completo
Minha saída do labirinto
De carne e lodo e musgo que sou
Eu me encontro novamente
Na cidade.
Sou um emaranhado
Infértil
De lodo urbano, mas
Que minha carne seja salva
Junto com a carne da cidade
Que me habita, que eu seja
Condenado como um verme
Roendo sua carniça, qualquer coisa
Menos a ilusão de um nome próprio.
E só
Mais um detalhe:
Traços negros, linhas negras amarrando
Um pedaço de carne, da carne
Da minha carne não é uma imagem
É um pesadelo, dolorosamente
Real.

2 comentários:

Aldemar Norek disse...

Daniel, bacana.
Só me incomodou a "explicação" assassinado/canalizado, que pra mim sobrou. E tvz o "dolorosamente/ real" tbm tenha dado chave demais. Mas as imagens são poderosas.
abração

Daniel F disse...

Oi Aldemar,

que bom que você gostou.

pois é, no final, estava acabando de escrever e resolvi sabotar o poema. Sei lá, me deu vontade.

Se algum dia eu for transformar isso em poema vou ter que mudar o final. Por enquanto, pra mim este aqui , como alguns outros não todos, é mais testemunho do que poema.

O que não impede que quem lê veja imagens, bem realizadas ou não. Aliás, como seria diferente? E só mesmo isso poderia interessar ou não, é claro.

Mas, pra mim não são imagens, do mesmo jeito que um sonho não é uma imagem, pesadelo idem, uma alucinação não é imagem etc. Mas, só dei exemplos de experiências de isolamento...


Abraço!

Daniel.