Mais um da série Fazer o Texto Falar (as montagens,
seguindo a técnica dadaísta de recortar as palavras de um texto, sortear
e montar um novo texto). Procuro respeitar ao máximo o sorteio, porque
ele é mais criativo do que eu, só mudo uma ou outra
coisa na pontuação, na concordância. As palavras, portanto, não são
de minha autoria. É da missionária em questão.
"Sim meus queridos mulher-com-homem, deixo de amá-los:
eu quero a lei para demitir a liberdade.
Como a mãe, como o meu empregado, se um rapaz,
como a cidadã, se um rapaz vai pro diário
quero a lei pra mim namorar.
Orientação sexual: missionária católica.
Eu prego nosso direito ao pedófilo
contra mulher com mulher ops
pensando em bolinar a orientação sexual de deputada estadual.
Não sou o próximo,
posso vir trabalhar pensando em demiti-lo,
quero defender a orientação da constituição que acabe com elas
e a igualdade e o respeito à mulher preconceituosa
não vou permitir ninguém querer meus primos lésbicas
se eu contrato, discrimino.
Quero ser oficial, se pronunciar para demitir minhas colegas.
Os direitos são meus filhos, e como.
Vou poder dar testemunho e ser respeitada por minha família sexual,
eu agradeço a escolha de ser uma pessoa muito sexual em casa:
homem com mulher, e um motorista para finalizar:
Malafaia não vai cometer uma disputa em casa, meus queridos,
e ele começa... sexual!
Por exemplo, a república é lésbica e eu não,
e eu convido vocês a demiti-la,
eu represento a pedofilia vestida de mulher:
mostrar que a constitução da maneira hetero me acompanha
e só vou permitir a violência de babá.
Ninguém é o próximo, digamos, pras pessoas lésbicas.
Deus é minha babá para perpetuar o Gênesis.
Deixando claro: eu eventualmente respeito a pedofilia dos deputados
contra a população travesti,
todos são meus filhos, na minha casa
e Deus criou os deputados, com certeza:
uma porta pra fazer nada;
respeito a sociedade federativa dos meus inocentes
e tenho filhos com homem e tenho meu voto.
Eu queria ser a menina de um Brasil sexual.
Amor é outra idade, agora não:
eu sou a babá da lei da espécie.
Clamo e vou clamar, vou orar e não vou deixar: não posso ter sangue
de raça homossexual."
Quando você é vulgar: apenas negocia convenções, não domina os segredos, qualquer um pode dizer que árvore é o nome de uma cidade, que cidade é o nome de uma arma, que arma é um sentimento, que sentimento é o nome de um faraó. A língua epistolar é a conversa vulgar no desentendimento, mesmo que este ocasione encontros repentinos e imprevistos. É quando uma criança autista diz pra você: se o mundo gira, porque você não fica tonto?
6/28/2011
6/24/2011
Só tem um jeito de responder às objeções de um rato:
Só tem um jeito de responder às objeções de um rato:
Falar a língua dos ratos.
Quando você se torna objeto
da curiosidade de um rato ele logo pensa que tem alguma coisa a ver
com sua vida – e tem – vampirismo é assunto de roedores. Você pensa meu idioma é outro mas veja como sua língua endurece seus dentes frontais se alongam e afiam seus olhos se tornam sonares sensíveis a
como não pode roer as próprias vísceras, todo rato se apaixona
por seus próprios excrementos. E como são lisas, quase esféricas as fezes de um rato – um rato odeia metáforas – cada coisa em seu lugar e tudo tem sua hora ¬– por isso um rato nunca vomita e como gosta de cagar regras consideradas autoevidentes por si mesmas
um rato é toda gente em geral e ninguém em particular (andam dizendo por aí, se diz à boca pequena – ah a boquinha pequena dos ratos por onde saem palavras pequenas e senti-
excrementos minúsculos – e quando um rato te olha com raiva pensando que assim vai causar medo em você – pelo menos incômodo – e causa – não há sentimento que um rato não manche com seus olhinhos-sonares e língua viscosa de tanto lamber merda – nunca deixe um rato lamber suas feridas mesmo que o rato seja você.
É com você mesmo que eu estou falando! Ah a língua cheia de parasitas dos ratos, a língua comum, a vigilância universal, os oito-olhos dos ratos, as regras e os códigos de conduta, os pressupostos e como tudo é preconcebido na vida do rato e como os ratos se apegam aos próprios excrementos e nada é por acaso na vida de um rato é assim que todo rato
faz cara de cu
& pensar que o rato é toda gente em geral e ninguém em particular, você com quem converso agora e eu quando respondo a você.
Falar a língua dos ratos.
Quando você se torna objeto
da curiosidade de um rato ele logo pensa que tem alguma coisa a ver
com sua vida – e tem – vampirismo é assunto de roedores. Você pensa meu idioma é outro mas veja como sua língua endurece seus dentes frontais se alongam e afiam seus olhos se tornam sonares sensíveis a
como não pode roer as próprias vísceras, todo rato se apaixona
por seus próprios excrementos. E como são lisas, quase esféricas as fezes de um rato – um rato odeia metáforas – cada coisa em seu lugar e tudo tem sua hora ¬– por isso um rato nunca vomita e como gosta de cagar regras consideradas autoevidentes por si mesmas
um rato é toda gente em geral e ninguém em particular (andam dizendo por aí, se diz à boca pequena – ah a boquinha pequena dos ratos por onde saem palavras pequenas e senti-
excrementos minúsculos – e quando um rato te olha com raiva pensando que assim vai causar medo em você – pelo menos incômodo – e causa – não há sentimento que um rato não manche com seus olhinhos-sonares e língua viscosa de tanto lamber merda – nunca deixe um rato lamber suas feridas mesmo que o rato seja você.
É com você mesmo que eu estou falando! Ah a língua cheia de parasitas dos ratos, a língua comum, a vigilância universal, os oito-olhos dos ratos, as regras e os códigos de conduta, os pressupostos e como tudo é preconcebido na vida do rato e como os ratos se apegam aos próprios excrementos e nada é por acaso na vida de um rato é assim que todo rato
faz cara de cu
& pensar que o rato é toda gente em geral e ninguém em particular, você com quem converso agora e eu quando respondo a você.
6/20/2011
De volta pra casa quando na verdade ninguém volta pra porra de lugar nenhum. A frase de cartão postal sobre o céu que é nosso mar é ilusão de maré vazante como se o fundo azul matasse a sede de alguém pelo simples fato de ser inverno. O Caminho produz nós de pescador, meus amigos estão enredados nos novelos das cinco dimensões tecedoras do mundo ilusório entrelaçadas pelas mãos dos três Venenos, eu também estou, nós estamos e quanto mais se luta pra se livrar mais fortes são os nós. O amor é um anzol enferrujado que vagueia como uma criança abandonada pelo céu. Não é por falta de amor que o Caminho é solitário, é que, sendo estilhaços de desejo cego, nos projetamos com nossos amores aonde eles nunca se encontram.
6/16/2011
Tanka para Lina
A vida mais frágil
Também deixa seus vestígios:
Vômito do gato
Seco no zabuton, mancha
De respiração ausente.
Comentário ao tanka
A casa vazia não
É o espaço indiferente
Na mente, no fogo
O gato caminha, por dentro
De si: um novelo de ar
Onde antes um coração
Batia.
Comentário ao tanka
A casa e seus objetos inertes, mesmo que o sofá velho vá se amoldando, como se um corpo o habitasse pelo avesso. O livro dos mortos no meio da pilha de papéis ao lado da televisão. Intimidade vazia e kitsch: o livro dos mortos sobre o dao de jing sobre os vagabundos iluminados sobre o rack comprado nas casas Bahia sobre o chão pintado de azul com manchas brancas como se fosse uma representação do céu com cheiro de desinfetante. A casa, porém, não é inerte. Se eu abrir um livro de Kerouac exatamente quando ele fala da morte do seu gato, momentos antes da paranóia: o gato que era para ele como seu irmão morto quando criança? E assim, uma camisa jogada sobre a cama parece um gato que dorme. Alguma coisa cai no chão e é como se um gato pulasse entre os móveis. Quando me deito no sofá é como se um gato viesse deitar ali comigo, na arte livre de nada fazer e pensar em nada, quase inertes. A casa é cheia de ecos. Os ecos são cheios de fantasmas. Os fantasmas são ausência presente, eco que desperta a mente do seu sonho de inércia. Por outro lado, as casas em que vivi, vazias de mim, onde entro às vezes quando sonho. Minha ausência do mundo: também estou predestinado à morte, a desabitar o mundo e deixar por aí traços, ecos anônimos que podem produzir um fio na espinha dos vivos.
Também deixa seus vestígios:
Vômito do gato
Seco no zabuton, mancha
De respiração ausente.
Comentário ao tanka
A casa vazia não
É o espaço indiferente
Na mente, no fogo
O gato caminha, por dentro
De si: um novelo de ar
Onde antes um coração
Batia.
Comentário ao tanka
A casa e seus objetos inertes, mesmo que o sofá velho vá se amoldando, como se um corpo o habitasse pelo avesso. O livro dos mortos no meio da pilha de papéis ao lado da televisão. Intimidade vazia e kitsch: o livro dos mortos sobre o dao de jing sobre os vagabundos iluminados sobre o rack comprado nas casas Bahia sobre o chão pintado de azul com manchas brancas como se fosse uma representação do céu com cheiro de desinfetante. A casa, porém, não é inerte. Se eu abrir um livro de Kerouac exatamente quando ele fala da morte do seu gato, momentos antes da paranóia: o gato que era para ele como seu irmão morto quando criança? E assim, uma camisa jogada sobre a cama parece um gato que dorme. Alguma coisa cai no chão e é como se um gato pulasse entre os móveis. Quando me deito no sofá é como se um gato viesse deitar ali comigo, na arte livre de nada fazer e pensar em nada, quase inertes. A casa é cheia de ecos. Os ecos são cheios de fantasmas. Os fantasmas são ausência presente, eco que desperta a mente do seu sonho de inércia. Por outro lado, as casas em que vivi, vazias de mim, onde entro às vezes quando sonho. Minha ausência do mundo: também estou predestinado à morte, a desabitar o mundo e deixar por aí traços, ecos anônimos que podem produzir um fio na espinha dos vivos.
6/12/2011
Mote (inapropriado) Glosa (impertinente)
Inapetente
de vida, o poder se come
a si mesmo. Fundo
vermelho nos olhos brancos
de ódio. Vazio
existencial no estômago
o poder embolora
a própria língua
impertinente.
* * *
Isolamento,
alma de arame
farpado, sangue
na ferrugem da alma
o poder persevera
na insônia, oito-olhos
abertos na consciência
em nome de quem
inapropriado.
de vida, o poder se come
a si mesmo. Fundo
vermelho nos olhos brancos
de ódio. Vazio
existencial no estômago
o poder embolora
a própria língua
impertinente.
* * *
Isolamento,
alma de arame
farpado, sangue
na ferrugem da alma
o poder persevera
na insônia, oito-olhos
abertos na consciência
em nome de quem
inapropriado.
6/07/2011
Minha namorada inventou uma tesoura de abrir veias, palavras escorrendo como sangria desatada, o fluxo, porque sangue parado é veneno, veneno de palavras que vão cavando fundo seus lugares, suas cicatrizes-sentimentos, porque alma é corpo, corpo de sangue e palavras, na alma calada por espinhospalavras o corpo se fecha, um labirinto de arame farpado fechado sobre si mesmo, cuja saída, ilusória, é o centro, o centro onde estão adormecidasdespertas as palavras sujas de sanguebílis amarela, sanguebílis negra, a terra infértil que é um lodaçal, um paradoxo de morte e vida, vida cega tal a morte, persistente vida, palavras são organismos que se arrastam, mastigam a alma por dentro, palavras têm fome, minha namorada telepata inventou instrumentos cirúrgicos estranhos, ela anda com flores agarradas no coração, minha namorada conhece o sofrimento com a precisão de quem também já viu o lodo de perto, o lodo da vidamorte, as palavras sangram, caem no chão, o destino delas não me interessa, minha namorada anda com preciosos instrumentos de observação, lupas pra vermos em escala reduzida e intensa as florações das luzes de Brasília, quando a luz bate no olho e das pálpebras brotam pétalas translúcidas-vermelhas e o silêncio multiplica encantos.
6/03/2011
Impressões
1. A cidade desabitada
espectral – mas a cidade sem
fantasmas.
2. O asfalto molhado leve como um espelho. Faróis refletidos, estrelas: poucas.
3. Fogos de artifício e felicidade ensaiada. Mas não é disso que se trata.
4. Nas minhas veias não há sangue: suas lágrimas. Estamos envolvidos numa teia de silêncio: fora da cidade, por dentro: a cidade lá fora nos cobre como o véu de Maya. Você veste sua nudez com minha camisa: refúgio; quatro flautas encantando os cinco sentidos; luz suave nas 10 direções; canto-caminho entre as linhas baixas do desespero e a sacralização instantânea do corpo. Orgulho singelo de anjos perdidos no caos encoberto pelas tramas do calendário. Os movimentos do mundo e seus barulhos se tornam uma forma musical de silêncio.
5. Os anos se dividiram, o calendário grita que uma coisa nova se inicia. Nós não nos damos conta. Divisão de almas não se mensura.
espectral – mas a cidade sem
fantasmas.
2. O asfalto molhado leve como um espelho. Faróis refletidos, estrelas: poucas.
3. Fogos de artifício e felicidade ensaiada. Mas não é disso que se trata.
4. Nas minhas veias não há sangue: suas lágrimas. Estamos envolvidos numa teia de silêncio: fora da cidade, por dentro: a cidade lá fora nos cobre como o véu de Maya. Você veste sua nudez com minha camisa: refúgio; quatro flautas encantando os cinco sentidos; luz suave nas 10 direções; canto-caminho entre as linhas baixas do desespero e a sacralização instantânea do corpo. Orgulho singelo de anjos perdidos no caos encoberto pelas tramas do calendário. Os movimentos do mundo e seus barulhos se tornam uma forma musical de silêncio.
5. Os anos se dividiram, o calendário grita que uma coisa nova se inicia. Nós não nos damos conta. Divisão de almas não se mensura.
Assinar:
Postagens (Atom)