Ratos de laboratório submetidos a eletro-choque ficam paralisados – de medo. Nem sequer procuram a saída do labirinto ou farejam a isca visível e apetitosa no centro da caixa.
Ratos também passam pela experiência
narcísica de olharem pra água à procura de si mesmos. Além de se reproduzirem em grande velocidade, os ratos se multiplicam porque tendem a ver o mundo como um amplo viveiro de fantasmas-ratos: ratos voadores com asas de anjos, ratos mutantes com flores plantadas no dorso. Todo rato real prolifera no mundo imaginário, ocupando-o com seus duplos, seus gêmeos, seus irmãos siameses, formando redes entrelaçadas por dentes finos e excrementos.
(Ai de você se um rato te tomar por espelho!)
É por isso que, mesmo que tomado de pavor, um rato sempre acredita que vence.
Entre os animais, somente dois matam outros de sua mesma espécie: o ser humano e o rato. Isso está começando a parecer uma aula de biologia. Mas não é isso. Existe um heroísmo de ratos. Uma coisa estilo pancadaria de desenho animado. Os ratos curtem andar coroados por seus próprios excrementos. Os ratos emitem sinais, guinchos: eles falam por dentro de você, da sua língua viscosa de betume, seus olhos de fio elétrico desencapado.
Você, o vencedor. Você, o coroado. Você, o que se agachou – para fora da possibilidade do soco. Você, o espancador de mendigos que viu seus finos dentes caídos no chão quando um deles revidou. Você, o que superou os traumas de infância se agarrando à tesoura como objeto-fetiche e parâmetro de astúcia e agora vomita estratégias imaginárias no mundo virtual, imobilizado no seu canto da caixa do laboratório.
2 comentários:
Sensacional!!! Fiquei inspirado, vou escrever também!!!
Gosto do diálogo com o Poema em linha reta. Os ratos daqui são "aqueles-que-são-bons-em-tudo" atualizados e revistos para o mundinho pós-moderno, ainda que eu deteste essa expressão.
Abração!
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