(obra de Martin Creed, na Tate)
e sem despertar do sonho Alice está num campo
minado Sábios desenrolam palavras como
papiros
em mesas de madrepérola e laca mas suas vozes
não cantam nada além de um falso estupor falso
boulevard crivado de neons onde os paralelos
estão cobertos de strass
[engalanados] enquanto
eles sentem que o verso é
desdobrar fibra por fibra
o coração do poema sonhando
com os fios tensos
que atravessam os vãos em alta freqüência até
o limite da dor ou seja do pensamento ou seja
do poema ou seja daquilo que se possa chamar
de sentido no mergulho do sublime Alice rabisca
à margem palavras que foram tatuadas no corpo
bem dentro [na pele dos dias] palavras que não re-
presentam nada, apenas são e emergem do fundo
trazendo bile sangue carne secreções sob o olhar
disléxico da musa anoréxica do fracasso inesperado
da palavra Os sábios fazem posições nos bailes
da corte entre perucas maquiagens e violas
de gamba de onde saem guitarras elétricas de onde
saem telas iluminadas de onde saem luvas de pelica
de onde saem céus galvanizados de onde saem sons
de apocalipse de onde sai a
trombeta do anjo
vingador de onde sai criptonita
de onde saem
labaredas de onde saem sintetizadores de onde saem
carreiras de pó na madrugada branca de onde saem
poetas raspando à unha o ouro das molduras
para enfeitar suas lombadas suas noites suas
metáforas suas vozes sua estese seu lugar nenhum
Um comentário:
Lembrei do mergulho no monolito ao final de 2001 - aquelas cores todas saindo umas das outras. A descrição vertiginosa acaba criando um fluxo narrativo não-teleológico.
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