7/04/2010

Um amor em Ipês

Um amor em Ipês?

Para a minha figueira

Tenho que parar o carro (não estou embriagado)
Desacelerar em um segundo
Parar e ouvir o som
O som dos Ipês

Confundi o tempo dos Ipês
Os vi como paineiras
Não percebi em seu(s) silêncio(s) que evoca(m) a vida
A beleza pura-híbrida dos Ipês

A cidade em comunhão com o céu
Azulado e anulado pelo anil celeste-brigadeiro
O brilho do sol toca
Cada flor dos Ipês perdidos pelas ruas: Ipês talvez sejam as ruínas do flâneur

Condenados a uma duração quase-vazia
Preenchidas apenas por seu breve desabrochar
Momentos de cor, qualquer cor ultrapassa minhas possibilidade de contemplar
Me lembro dos tucanos do Ora-pro-nobis

Agora são os Ipês das Minas
Ao lado de um tesouro recém descoberto: encoberto estava...
Tesouro: guardado, partido, legado.

Presentes da natureza
Alegrias que iluminam os dias de inverno: quase-raios dos dias
Alegrias que justificam a permanência da via e do viver

Se não fosse o amor e os Ipês da natureza
Só veria tragédia e ruínas:
Esperança, espera, esperma das nascentes
Nos fazem sonhar em plenitude fraterna

Os Ipês aliados ao amor que desabrocha
Devolvem a vida a ingenuidade infantil:
Vontade de simplesmente acreditar, de ter esperança
Ao pelo menos, brincar com as palavras sem esperar
Algum efeito e forma
Apenas uma tentativa de comunhão com as flores que já caem

A doença materna ganha, assim, poesia e poiesis
Lembro-me
Ainda bem que o tempo não é ainda das paineiras
Os frutos e botões das paineiras ainda são como figos
Ainda desabrocharam
O tempo das paineiras ainda não é
Em breve o tempo das paineiras chegará
E até lá é tempo de amar, pois é também tempo dos Ipês

É tempo de pescar as pérolas dos Ipês
E as outras poucas que existem por aí
É tempo de (pre)enchimento das fissuras
Dos nossos vazios floridos
Pena que seja sempre incompleto e instável:
As belas fores caem e há que se ver a beleza do vazio e da rua florida:
desafios incertos e tortuosos como os galhos a esperar o próximo inverno

2010

O tempo dos Ipês (Reedição)
Para Igraine

Em pleno ritual sagrado
as palavras seguintes baixaram
como uma pomba-gira.
Hoje de supetão minha filha perguntou:
"o que é o tempo"?
ela disse que para ela o tempo era o relógio
mesmo antes do relógio mecânico já existia o de
sol ela me disse.
O tempo é o relógio? (acho que ela queria me perguntar também)
Tentei explicar que sim e não. Fiquei sem saber o que fazer
foi aí que disse: o tempo são as flores do Ipê amarelo.
O tempo é relativo: qual é o tempo das flores do Ipê amarelo?
Acho que ela pensou: as horas do relógio do Ipê amarelo duram um ano
para florir,
os minutos uns meses florindo e os segundos são as flores caindo.
Fiquei com a imagem e a pergunta:
qual é o tempo dos Ipês?
qual é o tempo das suas flores?
belas flores
que florem o céu e a terra
Não há palavras e explicações!
queria ensiná-la a sentir os tempos
queria sentir os tempos
Pelo menos aprendi a desconfiar
e desconfio que o tempo caleidoscópico
dos Ipês é:
amarelo, branco, roxo e madeira.
2009

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