7/10/2013

Da ilusão do sujeito como agente de si mesmo.

Vou me salvar tirando lodo de mim como quem se cava com uma escavadeira. Lodo etéreo visto de fora (por dentro, quantos animais mortos) – vermelho translúcido que vai se abrindo nas feridas, na superfície densa. E mais de longe um brilho distante, como uma transparência que pudesse te abraçar, leitor, e sua pele toda uma pétala a ser contemplada pelos que procuram a verdade na beleza e na ternura.
Ou: se ao menos alguém se salvasse dessa forma, esse jogo demente teria sentido.

*
Você sai para caminhar e sem aviso – chove. A chuva atravessa a camisa, toca a pele, o frio passa dos nervos para a alma que está sendo criada nesse instante e é toda uma perspectiva que se abre, tátil (a mente também é pele e tenta sentir o encantamento do dia, um calor impreciso no fundo do frio). Sabe-se que não se deve perguntar se a chuva tem um propósito a seu respeito. Mas a pergunta inversa também é um erro: qual o seu propósito ao dizer a chuva como um acontecimento que te envolve, de corpo e alma.  Você chega em casa, olha pela janela e o céu está aberto, claro – o asfalto está completamente seco. Você olha perplexo para os seus braços, que parecem ramos orvalhados.

           



2 comentários:

Anônimo disse...

Gostei muito, Daniel!

Daniel F disse...

que bom que você gostou, Lara! é muito
bom saber isso.

Abraço